• Sexo, Baladas e Outros Blues
  • Sexo, Baladas e Outros Blues


    por José Neves Filho

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    O Romantismo agoniza em uma cama. Morre um pouco por dia, ou por noite, a cada flash no claro/escuro da balada sem fim (mas ninguém vê ou quer ver). Alguém me diz: “isso é bobagem” em meio à nossa reflexão de mesa de bar. Eu contesto, digo que em cada carícia desconhecida e fácil e “íntima”, se encontra não só o tesão latente dos corpos partilhado, mas um quê do romantismo que se esvai. A vida geralmente demanda tempo para a conquista da intimidade de alguém, e não sabemos mais esperar e sequer sermos íntimos (e querer sermos íntimos). O sexo – fetiche socialmente difundido e sequer compreendido por cada um – não sabe e não quer esperar, talvez porque não precisa de intimidade. Precisa de dois corpos dispostos a obter prazer. Só.

    Há uma confusão entre intimidade e sexualidade (o que muito exalta o pessoal da mesa). Peço até mais cerveja para continuar. E o que eu falo na seqüência, ao que meus amigos imediatamente gritam “para de viadagem”, é que nada é ou pode ser mais íntimo que o beijo. No beijo é possível um nível de intimidade muito maior. Não é possível haver o orgasmo pleno do corpo, mas sim a satisfação do sentimento. Talvez por isso mesmo seja a entrega mais genuína de alguém pra outra pessoa. Até pelo necessário contato rosto com rosto, a própria simetria que aproxima olhos dos olhos, que junta boca com boca… é quase forçoso encarar, flertar, desvendar – se entregar à outra pessoa. Quase, porque não é essa nossa prática, vide as baladas, micaretas e semelhantes festas em que cuidamos exatamente de fazer o oposto, banalizando o beijo como ato de primeiro contato sexual, cartão de visitas. Sim, somos incoerentes. Queremos carinho e intimidade, muitos de nós querem isso, mas fazemos o oposto em nossa busca diária (ou noturna) por isso. Busca de aceitação social? Talvez. Independência sentimental? É, não muito, mas também faz sentido.

    Da ponta da mesa alguém pergunta: “Mas se o beijo é o mais intimo, o sexo é o que?”. Aí tomo o último gole, ponho o copo sobre a mesa e retomo a idéia. O sexo pode ser íntimo também, claro, mas também pode ser feito sem que o casal mal se olhe nos olhos, mal se beije. É, por exemplo, produto largamente comercializado pelas esquinas, dada a possível “distância” na prática – o que possibilita a inacreditável relação “cliente” e “prestador de serviço”. O sexo e a sexualidade se banalizaram (e nesse caminho se perderam um pouco), quando alguém em algum momento concordou que o bonito na mulher de vestido era a nudez – mas não percebeu que a beleza estava na insinuação das formas do corpo. É não entender que o que excita na lingerie é mais o prazer de tirá-la (e a posterior revelação do corpo e tudo que envolve esse momento) à mera exposição da carne, tornada dessa maneira mero subproduto do sexo (além da própria mercantilização do sexo). E defender isso até o final é difícil, já ouço protestos do outro lado da mesa que me chamam de careta, mas sigo persistente.

    É uma visão romântica e peculiar que tenho, claro. Não sou, não consigo e não quero ser, do grupo que pensa que homem não chora, que lugar de mulher é na cozinha ou que mulher é artigo de luxo ou troféu pra se colocar na prateleira e exibir pra todos (embora pessoalmente me orgulhe de algumas conquistas). Sou daqueles caretas que ainda pensam que amor se faz com quem se ama e sexo com quem se deseja, e embora transe por desejo e tesão (e tenha certa/grande dificuldade em me acostumar com a prática do sexo pelo próprio sexo), acho pessoalmente incomparável a sensação de fazer amor à qualquer outra. Enfim, falo de coisas fora de moda, sentimentos e idéias que não estão no hashtag da semana, nem serão as mais aceitas da mesa (e a cerveja já acabou há algum tempo). É hora de pagamos a conta e ir embora pra senão chegamos tarde na balada (e quando a luz apagar e a festa acabar, José?)


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