• A Traição Nossa de Cada Dia
  • A Traição Nossa de Cada Dia


    Acordar cedo, tomar banho, sair correndo para pegar o metrô. Chegar no trabalho às 9h, sair às 12h para um suposto almoço, fazer uma ligação e entrar no motel com uma desconhecida. Voltar pro expediente, chegar em casa e dar um beijo de boa noite na mulher ou namorada. Essa é a rotina de muitos homens que conheço. E essa naturalidade gigante com que a traição é tratada vem de um princípio clichê feminino (e deveras masculino): homens são todos iguais e não valem nada, portanto traem.

    De início eu pergunto: é inerente ao homem a condição de traidor?

    Cada vez mais vejo amigos justificando o fato de não quererem romper com as supostas namoradas perfeitas, mesmo acharem a relação sem graça. Aquela coisa meia-boca que deixa a vida sexual meia-bomba e por aí vai. Mas isso é natural. Não que justifique como certo ou errado, mas é natural. Seguindo uma linha simples de raciocínio, a gente consegue entender porque a traição é encarada como uma coisa normal e que pode vir a fazer parte de toda e qualquer relação: antes daquele relacionamento, ele sentia tesão por outras pessoas. O tesão por outras pessoas não morreu quando se aceitou tomar parte de uma relação mais séria. Ele só abre mão da liberdade do pau louco porque tem outros motivos que o fazem dar mais valor à mulher/namorada do que o sexo com outras.

    Homem é um ser prático que prefere manter os outros aspectos do relacionamento como estão e saciar esses desejos sexuais com outras mulheres, principalmente prostitutas, pela falta de envolvimento pessoal e emocional. É coisa de moleque? Pode ser. É coisa de quem não presta? Também pode ser. Mas o real motivo pelo qual traições ocorrem é a falta de comunicação e o comodismo, em um senso bem estrito. Relações mais longas tendem a cair na rotina e fazer com que uma das partes (ou ambas) perca o tesão na outra. E daí, aquela coisa chamada senso prático e o instinto visual masculino que acha que uma trepadinha não faz mal a ninguém e não vai mudar o seu relacionamento guardado numa redoma de vidro. Por mais que pareça bobo pensar assim, uma ereção causa deslocamento sanguíneo de algum lugar e o aumento da adrenalina no corpo (e daí surgem as brincadeiras sobre falta de oxigenação cerebral e homens pensando com a cabeça de baixo). Culpem a testosterona. A gente pensa menos e age mais. Mesmo que a gente se arrependa depois, o caráter e o estado da relação é quem vai dizer o que acontece a seguir.

    No geral, os relacionamentos que não possuem diálogo ou são moralistas demais na cama acabam por amornar. Sexo não pode ser morno, senão esfria facilmente. É cumplicidade. É chegar pro outro e dizer: “Olha, eu gosto quando você vem por cima e de lado. Mas me machuca ficar de quatro”. É dizer pra namorada que adoraria um anal com ela e que vocês podem ir tentando até ela se sentir confortável. É disso que a gente sempre fala, que parece óbvio e que a maioria dos casais não entendem: se não houver sinceridade, a coisa desanda.  Às vezes, me parece que casais tratam as coisas de modo inverso: quanto mais intimidade tem com o parceiro, maior tende a ser o pudor na cama. Se fosse uma desconhecida num sexo casual, ele faria mais o que tivesse vontade do que pensaria o que pode pegar bem ou não porque tem uma vida a dois.

    E eu volto pra questão feita: traição é inerente ao instinto masculino? Não. Por mais que a gente tenha algumas facilidades e condições físicas que incitem a traição, ela é completamente abrangente aos dois sexos. Homem trai, mulher trai. Com naturalidade ou não. Na cara de pau ou não. E os motivos são variados e vão além do que foi falado aqui. A traição nossa de cada dia tem mais a ver com o que a gente pensa e como a gente pensa sobre sexo num relacionamento. Quebrar aquele tabu numa Era moderninha ainda é difícil, por mais fácil que aparente ser. A naturalidade com que a rotina de alguém que trai é tratada deveria ser a naturalidade com que sexo a dois é tratado. E se você se espantou de cada com essa rotina, talvez sexo ainda seja um assunto que espante você.

     


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