Nesta noite, nada de meia-luz, música, velas, pétalas; nada de cinta-liga, salto alto, maquiagem, manobras sexuais; nada de jogo de sedução, nem de sedução propriamente dita. Nesta noite, apenas duas pessoas, exatamente como elas são. Não há nada mais íntimo que isso.
Não há strip-tease mais íntimo do que aquele em que você, exibindo suas sardas e marcas de espinhas, usando moletom, meias e seus enormes óculos de leitura, consegue olhar no fundo dos olhos daquele cara, sem qualquer pudor.
Não há strip-tease mais íntimo do que aquele em que você se sente à vontade para mostrar quem você é de verdade e falar o que você pensa e sente de verdade. Aquele em que, com a mesma leveza que tem para tirar cada peça de roupa diante do outro, você consegue tirar cada peça da máscara que usa diante da sociedade.
E começa o show…
– Eu tenho medo de amar – lentamente, tira o cachecol.
– Eu fumo escondida de vez em quando – lá se vai o casaco.
– Já tive um caso lésbico – abre-se cada botão da camisa com suavidade.
– Fui reprovada no semestre passado na faculdade – o zíper é empurrado devagar e logo a saia escorrega pelo quadril e vai ao chão.
– Sou a pessoa mais insegura do mundo – os sapatos, um por um, deixam delicadamente os pés.
– Sou um desastre na cozinha – a cinta-liga é solta e as meias 7/8 deixam revelarem-se as pernas.
– Já tive vontade de matar, e de me matar – de costas para ele, abre o fecho do sutiã.
– Já traí alguém – e lá se vai, triunfante, a calcinha.
O olhar dele, nesta noite, não é de tesão como em noites anteriores. É de admiração, de respeito, quem sabe até de amor. E a relação dos dois, neste momento, deixa de ser um ensaio. Passa a ser real, passa a ser pra valer. Deixam de ser pessoas fragmentadas – tornam-se dois inteiros.
Tirar o sutiã e a calcinha é o de menos. O grande strip-tease é se livrar das máscaras.