Existem duas situações na vida que todo mundo um dia vai ter que passar. São as situações mais constrangedoras possíveis e não há ser humano que tenha conseguido se livrar delas. A primeira é aquela desagradável sensação de entrar no elevador com a sua vizinha de prédio e nunca saber o que dizer. A etiqueta do elevador, manual que nunca foi escrito, poderia ser um dos grandes tesouros da humanidade que reside nas grandes cidades. A segunda situação igualmente constrangedora (ou pior, dependendo de referência) é o famoso “Dia Seguinte”.
O dia seguinte é o dia que pode definir o rumo das coisas dentro de um quase relacionamento. Você foi a um encontro, se divertiu e passou uma noite bacana. De repente, calhou de vocês terem tido algo (que pode ter sido pegação simples ou sexo selvagem de quebrar a cama). Você curtiu o cara/a garota e quer repetir o feito. E agora? Existe uma etiqueta do dia seguinte?
A regra é clara: se sentiu interesse, demonstre de forma sutil. Isso quer dizer que se você é homem, vale a pena mandar aquele SMS discreto dizendo que curtiu e que queria marcar alguma coisa. Se você é mulher, vale o mesmo na sutileza (embora haja todo aquele imaginário de que fazer contato feminino dentro de 24h dá a impressão de que você é uma louca psicótica que espera para casar desde que nasceu e já fez todas as promessas disponíveis no mercado – ignore-o se puder).
Nos casos em que o encontro resultou em sexo e você curtiu a pegada, a quebra da cama e o cheiro do apartamento da pessoa, o dilema começa na hora de levantar. Se sair de fininho, pegando as roupas no chão e desaparecer na rua você provavelmente vai ser cortado da lista de preferências da outra pessoa. É mais fácil acordar o outro e dizer que tem que ir, mas liga mais tarde. Ficar para jantar pode parecer um pouco invasivo. Até porque sexo não é promessa de casamento e intimidade é muito mais do que ver o outro pelado. Abolir a mania do “eu te amo” no lugar do “bom dia”, lembrar que o celular dele(a) não é número do delivery para ligar toda hora, não tocar nas palavras “casamento” e “filhos” antes de vocês terem pelo menos algum relacionamento mais sério e outras regras incorporam essa etiqueta do dia seguinte no imaginário geral.
O problema de hoje em dia é que a tal etiqueta criou uma ideia de que se dizer disponível é errado. Que a ditadura do interesse deve preservar o interessado em prol de um dito orgulho banal. Ela ainda preserva ideias de que a iniciativa tem que partir do homem e de que a mulher tem que ficar em casa esperando uma ligação. O mesmo acontece na situação em que um dos dois não quer mais nada com o outro porque aquela única experiência foi ruim. O “comum” é que o cara suma ou descubra uma doença terminal de surpresa que o impeça de se relacionar com você; e a garota dê o número errado ou descubra uma herança deixada por uma tia de terceiro grau e vá embora para a Polônia.
No geral, definir o que é certo ou errado é bastante complicado e apresenta várias vertentes dependendo da situação e das pessoas envolvidas. Alguns conceitos (machismo, timidez, comodidade e afins) tornam tudo mais difícil e poderiam ser repensados para que um novo capítulo do “Manual do Dia Seguinte” fosse escrito. Isso tudo quando um “não vai rolar mais, foi bacana e tal, mas eu não quero levar nada adiante” poderia resolver metade das frustrações que a gente carrega nos dias seguintes da vida, tanto pra quem recebe um corte quanto pra quem dispensa alguém. Mas a nossa tendência é sempre complicar todo tipo de coisa quando se trata de relacionamentos. E é por isso que é muito mais fácil reunir as forças e as experiências para escrever um “Manual de Etiqueta do Elevador” do que conseguir definir todas as regras para o dia seguinte, por mais constrangedor que seja passar 19 andares disfarçando o cheiro do pum enquanto a sua vizinha fica olhando para você.