Toda mulher em algum momento da vida amorosa já levou um fora e recebeu da amiga a frase supostamente consoladora: “Esse cara não era pra você“. Variações desse mesmo tema seriam “ainda não chegou sua hora“, “ele não vale o seu amor“, “ele não te merece“, “tem quem queira“, entre outros.
Esse conselho tende a ser extremamente duvidoso, já que, se o cara não tivesse caído fora, provavelmente o comentário seria algo do tipo: “Estou tão feliz, vocês nasceram um pro outro!”. O critério dessa esperteza da amiga para identificar a alma gêmea depende do resultado, portanto, reflete uma maneira bem infantil de lidar com a frustração. A filosofia embutida no conselho é estéril, pois cria uma realidade ilusória ao tentar convencer a rejeitada de que ela não foi realmente deixada de lado. É como se mascarasse o fato de que não houve uma amor/desejo/tesão de verdade.
Vejo uma especial dificuldade das mulheres em admitir essa recusa, já que costumam estar com a varinha das decisões na mão na maioria das vezes, o que dificulta a digestão da realidade. Quando elas próprias se veem na berlinda da vida e são recusadas, acabam usando desses artifícios mentais para passar um pano sobre a mancha do fracasso amoroso e fingir que nada daquilo existiu. A mesma visão cheia de orgulho – que nega a realidade – é aquela que faz muitas mulheres permanecerem meses na esperança de que o cara um dia irá deixar o trabalho/família/namoro “ruim” para ficar com elas.
Esse tipo de mentalidade precária está presente em muitas fases da vida dessa garota e pode ser uma armadilha enganar a si mesma tantas vezes.
Se ela quer um trabalho e tenta passar nas entrevistas de emprego sem sucesso alguém vai dizer “esse lugar não era para você!”, ou seja, “já que você não passou vamos todos fingir que não queria o trabalho dos sonhos só para não ficar destruída“. Acho um crime psicológico induzir alguém a rebaixar seus desejos só porque a realidade ainda não atendeu as suas metas. Seria mais realista se esforçar, aplicar, estudar e tentar novamente e diante da impossibilidade final alegar insuficiência pessoal e bancar a tristeza do sonho não realizado, mas não fazer de conta que no fundo não queria aquilo.
O engano subliminar dessas frases de consolos é “só deseje algo de verdade se sair vitorioso, caso contrário negue seus sentimentos e finja que está tudo bem”. É o despeito camuflado da sabedoria de dar a volta por cima, ou seja, coisa de quem nunca consegue ficar por baixo por nenhum instante na vida.
E se o sujeito volta disposto a entrar num relacionamento por inteiro, o que ela vai dizer? Vai fingir que não queria e ele não era feito para ela? Vai negar tudo o que tentou se convencer? Ou vai usar a mesma lógica as avessas e dizer “claro, eu nunca quis te esquecer“?
Não acho honesto as abordagens que reprimem a dor natural pela perda de alguém valioso com o pretexto de proteger a autoestima (ou narcisismo) da amiga e não deixar a peteca cair. A demonstração de amizade madura seria dizer algo do tipo: “Você queria tanto entrar nesse relacionamento e fico triste pela perda, agora deixa a poeira abaixar e tente se recompor devagar, no seu tempo”. Muito mais honesto e realista.
Para agir com essa maturidade emocional diante da dor da solidão recusada, é essencial assumir a tristeza sem autopiedade e com humildade para poder seguir em frente, mas sem desviar os olhos da realidade difícil – afinal, somente quem encara os fatos de frente na vida, consegue usufruir dos benefícios que chegam depois dos espinhos.