Já perdi as contas das tantas vezes que ouvi alguém falando, com o peito estufado, o quanto sonhava em fazer algo. Até aí, tudo bem, afinal, toda e qualquer realização começa com um simples sonho, não é mesmo?
Já escutei amigos dizendo que queriam viver do surfe e, como manda o figurino de um bom camarada, eu os apoiei com todos os olhares de “vai dar certo”. Emprestei para eles um pedaço de parafina, a minha prancha toda, o repelente contra tubarões, a companhia no mar estupidamente gelado e os melhores conselhos que pude tecer, mas logo percebi que nada disso adiantaria, porque não há incentivo que vença o medo. O mundo está cheio de gente que morre de medo de tentar verdadeiramente, de gente que deixa prevalecer um enorme pavor das possíveis frustrações advindas daquilo que nem sempre acontece como planejamos. E pior: descobri que aquela vontade toda dos meus amigos em fazer do surfe um ganha-pão não era nem sequer um sonho, e sim uma utopia confortável, escolhida pelo simples fato de ser impossível de ser alcançada por alguém que não estava realmente disposto a virar a mesa ou levantar a bunda da areia fofa.
A “frustraçãofobia” não é algo exclusivo desses amigos que hoje nem surfistas de tábua de passar roupa se tornaram. É um medo demonstrado todos os dias através das falas daquelas pessoas que vivem dizendo que querem conhecer alguém interessante e que nem de casa saem para criar a chance de isso acontecer. E, quando saem, nunca dizem nem um sucinto “quer jantar comigo?” para aquela garota interessante, com medo da possibilidade de receberem um ainda mais breve “não”. O mesmo acontece com aqueles que dizem querer emagrecer, mas nunca abrem mão dos cinco pedaços de pizza em uma refeição, ou com as pessoas que querem tocar melhor do que o Jimmy Hendrix, mas morrem de preguiça de treinar os acordes básicos.
E para piorar o cenário, há ainda os desmotivadores de sonhos. Muitos disseram que se eu fosse um escritor, eu correria grandes riscos de um dia acordar junto com alguns mendigos, sem dinheiro e com meus garranchos perdidos entre jornais velhos e amassados. Talvez isso realmente aconteça e pode ser que eu acabe a vida lendo poemas em troca de míseros trocados, mas só conheço um jeito de talvez provar que aqueles que não acreditaram em mim estavam errados: aceitando o risco iminente dos muitos “nãos”, “você é um merda” ou “enfia esse livro no cu” e até “minha priminha de cinco anos escreve melhor do que você”.
Sonhar é bom, sei que é, mas preste muita atenção nos seus sonhos e veja bem se eles não são utopias, atrás das quais você se esconde para evitar as frustrações naturais da vida. Pense que nada será inatingível se você realmente quer atingir. Eu, por exemplo, sonhava em escrever um livro, e hoje não sonho mais. Sabe por que? Porque sentei a bunda na cadeira e, enfim, escrevi. Varei madrugadas, deixei de aparecer em festas e peguei até gripe de tanto me alimentar somente de papel e pensamentos. Mas eu fiz. E, felizmente, aprendi que o gosto da realização é muito mais saboroso do que o aroma não palatável de qualquer sonho.