Isso é coisa de gente que não soube se emocionar na adolescência. Eu me lembro que com 20 anos eu não tinha medo de nada – a não ser da morte prematura, do sofrimento e da solidão. Felizmente nenhum dos três me atingiu. Só Deus sabe a alegria que me dava ficar na rua com gente que me diziam ser “ruim”, vendo como viviam, o que pensavam e o que os fazia parecer tão não-recomendáveis. Eram todos ótimos, cheios de boas histórias e tão destemidos como eu. Foi dessa época que nasceu meu namoro eterno com a noite, minha admiração pelo barulho, pela bagunça e pela efervescência da juventude. Afinal, não se é jovem para sempre.
Hoje vejo gente da minha idade que não soube se divertir, que não soube se entregar, podando a moçada que quer descobrir o mundão lá fora. Hey, teachers, leave them kids alone. Imagino o quão babaca cresce alguém que não pôde experimentar o melhor da adolescência. Eu nunca seria capaz de encarnar a caretice de brigar e dar lição de moral em alguém que comete os mesmos erros que eu cometia. Isso é coisa de quem não viveu, não se fodeu, não aprendeu e quer ser dono da verdade. Sabem nada… assim como todos nós.
Me preocupo muito em conseguir chegar a tempo de dizer “meu chapa, eu fiz assim e deu merda”, para não me sentir omisso. Mas a vida é feita de escolhas, e vale muito mais apontar as opções do que obrigar alguém a escolher a que você julga ser a certa, sem explicar o motivo ou deixar que se arrependam sozinhos das escolhas que fazem. Dar o próprio exemplo funciona, eu juro. É o caso da mãe que diz pros filhos que tais coisas não são certas, mas que deixa que cada um deles entenda sozinho o motivo daquilo. Fui criado na base do “escolha o certo” e não do “escolha o que eu disser para você escolher”, e isso fez toda a diferença.
O menino não pode fumar porque faz mal. Porque vicia. Porque estoura os pulmões. Mas se ele quiser fumar, nem um milagre vai fazê-lo desistir da ideia, perder a curiosidade e deixar pra lá. Ser jovem tem tudo a ver com aprender na marra, comprovar empiricamente, sentir na pele e decidir só depois. Deixa o menino fumar, uma hora ele decide se aquilo é bom ou não. A mocinha não pode sair de roupa curta porque é coisa de vagabunda. Porque aparece a bunda. Porque vai perder o respeito. Porque não vai arranjar um cara legal. Deixa ela! Vai ver, dentro do tubinho preto curtíssimo dela, quem sabe, ela perceba o que é o preconceito, o que são valores sociais idiotas e quais são as verdadeiras mentiras que as pessoas contam. Talvez ela encontre um namorado que goste das roupas dela, talvez ela descubra que o que importa é se sentir confortável e talvez um dia ela sinta frio e decida sair com algo maior. Mas deixe a mocinha decidir sobre o próprio corpo, as próprias roupas, a própria aparência e sobre a própria vontade.
Não pode beber porque é coisa de marginal, porque acaba com o homem, porque mulher de verdade não fica bêbada. Que grandes merdas a juventude ouve “da gente”, não? Os caras dão de frente com os pais bebaços de caipirinha na feijoada de domingo com a família, mas não podem fazer o mesmo na baladinha de sábado com os amigos novos. A gente envelhece e começa a ficar cego para o quão hipócritas são nossas opiniões. Cinco anos atrás ninguém gostaria de ser censurado como censuramos os jovens de agora. Deixa os caras aprenderem com a vida: melhor aprendizado não há.
Aí a menina fica cansada da infância e decide dar uma olhada no que é que tem pra lá do playground, pra lá do condomínio, pra lá dos muros da escola. Aí a menina descobre que fumar maconha é legal de vez em quando, mas sozinha ela percebe que fica meio lenta e decide que não é bom fumar sempre. Aí a menina descobre que cerveja é ruim, mas é bom. Que álcool é divertido, e depois do primeiro porre, sozinha, sem bronca nem sermão, aprende que tudo tem limite e que agora ela já sabe até onde pode ir. Aí a menina descobre que variedade é bom, diversidade é ótimo e começa a beijar os menininhos do colégio, depois os amigos das amigas, depois o irmão mais velho da outra amiga e depois começa a descobrir que tipo de homem a atrai. Depois ela aprende que sentir prazer dá vontade de dar prazer e que dar prazer também dá prazer. E quando a vida vai caminhando para ela aprender todo o resto, uma porção de jovens-velhos se sentem na obrigação de intervirem, de salvar a moça, de impedir que ela seja uma “puta”. Quanto “20 e poucos anos” envelhecido precocemente, meu deus. Na boa, ensina que camisinha é lei e deixa a menina transar!
Originalmente publicado em Memórias Utópicas.