Conforme envelheço, certos assuntos parecem ficar mais distantes, como uma antiga fotografia há muito não revisitada. Quando comecei a pensar neste assunto, a virgindade, foi como abrir um álbum de fotos e me ver ao lado de alguns amigos, sentados numa mesa qualquer de uma praça de alimentação.Comendo em algum shopping de São Paulo, provavelmente no Mc Donald’s e tomando refrigerante numa sexta-feira à tarde (o auge, naquela época, da nossa vida social). O assunto era quase sempre o mesmo: sexo. Correção. O assunto era quase sempre era algo em torno de quando alguém iria fazer sexo, O que era sexo, Como deveria ser fazer sexo, Quando tempo demora uma transa, Dói?, É difícil? e muitas, muitas variáveis.
Além desses questionamentos completamente normais, preocupava-me com o outro elemento da equação – afinal de contas, todas minhas experiências sexuais até aquela época haviam envolvido apenas uma pessoa: eu mesmo. E, convenhamos, é bem fácil transar com você mesmo. Mas eu, que nunca havia sequer namorado, me encontrava em um dilema: seria mais fácil (ou melhor) perder a virgindade com alguém inexperiente ou experiente? Eu deveria mentir para a pessoa, fingindo não ser mais virgem?
No fim das contas a virgindade foi embora e tudo se provou ser muito mais simples do que parecia em minha cabeça – como praticamente todas as coisas da nossa vida, né? O grande problema é que nem sempre é assim tão simples. Conheço homens e mulheres, de distintos círculos sociais (e níveis de intimidade) que estão na faixa dos 20 anos e são virgens – não por escolha própria. Dentre as diversas histórias que já ouvi deles e delas, o problema que mais se destacava era justamente o medo da reação alheia. Como você geralmente não conhece alguém contando sobre a sua vida sexual (ainda que essa seja uma abordagem no mínimo inusitada), presume-se que um jovem adulto já passou por essa experiência.
O grande problema, pra mim, ainda é a maneira como enxergamos sexo. Nossa sociedade têm uma visão pudica, conservadora e protetora quando esse é o assunto – e isso prejudica não só quem ainda é virgem, mas nossa forma de lidar com esse “tabu” (em aspas que deveriam ser muito maiores do que estas aqui postas). Ainda que sexo possa ser feito com amor – e que sua qualidade cresça exponencialmente com esse fator -, às vezes é só sexo. E fazê-lo da primeira vez é como andar de bicicleta ou fazer qualquer outra atividade que ainda não se sabe: é marcante porque você aprendeu algo que não sabia, e só. Algum tempo depois (de subir na bicicleta ou em cima de alguém), o pensamento é sempre o mesmo: eu tinha medo disso?
Vejo ainda muita gente com medo de ser importante na vida alheia, com medo de ser o primeiro de alguém, de tirar a virgindade, de deixar esta marca na vida de outra pessoa, só porque ela chegou a uma certa idade virgem. Chegou a uma idade que estabeleceram como padrão social que você já deveria ser experiente. Como se deixar uma marca na história de outra pessoa só fosse aceitável se nunca mais abandonássemos esse alguém. Não é assim que as coisas funcionam.
Nossa vida só existe pelo encontro de outras duas pessoas, nossos pais – que podem se amar até hoje ou não. Sem elas, você não existiria, e nenhuma delas tinha certeza de que ficaria com a outra durante as décadas seguintes. Como dizia meu mestre Vinicius, a vida é a arte do desencontro – ainda que haja tanto desencontro nessa vida. Não tenhamos mais medo nenhum de nos encontrarmos e desencontrarmos em outras pessoas – seja numa primeira, segunda ou quadragésima oitava vez. No fim, o que fica são nossas histórias, amores e desamores.