• Carta aberta para a mulher  para a qual eu nunca liguei de volta
  • Carta aberta para a mulher


    para a qual eu nunca liguei de volta


    Não teve problema com operadora, o teu celular não tava com defeito, nem fui assaltado e tive que mudar de número. Eu tava ali, parado no meio do mundo, no mesmo lugar de sempre, numa despedida que deveria ser breve e um beijo-de-te-vejo-mais-tarde, com uma decisão nas mãos e tudo mais. Bati um “te cuida” na testa, esperei você entrar em casa e desapareci junto com a curva na esquina.

    Não era um daqueles planos mirabolantes do Pink e do Cérebro pra te comer, sumir do mapa e ir conquistar outros territórios por aí. Pra dizer a verdade, esse War sexual nem me interessa muito. Queria te falar logo depois do jantar, quando deu aquele BAM! na minha cabeça e eu percebi que não era você, que talvez não fosse eu, que não seria naquela noite nem nunca mais. Eu tava disposto – e acho que no fundo a maioria está – a conhecer melhor teu mundo, me encantar por ele, trocar mais beijos-de-como-você-tá-linda-hoje do que beijos-de-até-nunca-mais. Ouvi, falei um pouco, pedi dois pratos, bocejei, olhei pro relógio, você também, ninguém sorriu e acabou ali mesmo.

    Relacionamento é um treco meio doido mesmo, você nunca vai saber quando a culpa é sua – por ser chata, egocêntrica, focada em trabalho, louca dos gatos, coisa e tal – ou se o cara é que é babaca. Eu costumo levar minha teoria de que nunca é culpa de ninguém. Só foge mesmo do controle esse lance do santo bater, de rolar química, das faíscas resultarem em algo mais do que um sexo bom numa quinta-feira, etc e tal. Com você foi assim: não era pra ser (e não foi). Mas como dizer pra alguém que a gente entrou na vida dela e decidiu não ficar? Como evitar aquele peso penoso que o outro vai carregar e encarar como rejeição – porque essas coisas doem pra caramba, sei porque carrego isso na pele e sinto arrepio só de me lembrar das gurias do Ensino Médio que me desprezavam.

    Quando a gente não quer mesmo, nunca quis, não tem apreço nem sente um carinho comedido, ainda que seja um misto de pena com simpatia, a gente nem disfarça. Dá logo um corte conciso na jugular, um belo tiro de misericórdia que começa com um “veja bem” e termina com “eu não tô a fim de você”. O jeito alternativo é ignorar o discurso e se desligar. Sumir do alcance num raio fora de programação do Tinder. Retirar o Last Seen, o status de ativo no Facebook, adicionar o número pra lista de rejeição e voilá, evitamos que você nos ache um filho da puta (da maneira mais filha da puta possível).

    Veja bem, você é legal, saca? Eu não podia jogar a verdade nua, crua (e cruel) em você. Se a verdade, o fato de querer saber desesperadamente o porquê de eu não ter ligado, o porquê de eu ter me mudado pra Marte e não ter deixado rastros, levanto a bola já muito discutida na MPB e aproveito pra quotar um clássico. A verdade é inconveniente, difícil e o Lulu Santos até conseguiu sintetizar o sentimento disso em alto e bom som uma vez: não imagine que eu te quero mal, apenas não te quero mais.


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