Hoje não deu.
Eram dezoito e quarenta e cinco – um horário em que geralmente as pessoas se movimentam – e eu estava aos prantos no elevador velho quase-mal-assombrado daqui do prédio.
O porteiro teria certeza de que sou louca (até então, eram só suspeitas), a vizinha bem-sucedida que usa sapatos de verniz e está impecável, maquiada, sorridente e sem olheiras às sete da manhã me olharia com aquela cara de “coitada dessa maluca”, um estranho possivelmente perguntaria se eu precisava de ajuda quando me visse sair do elevador soluçando, mas eu honestamente não dei a mínima. Eu precisava chorar.
Meu dia foi difícil. Ouvi uns vinte assédios na rua (até começar a me sentir um pedaço de picanha na brasa). Meu chefe reclamou do meu trabalho. Eu não consegui cumprir nenhuma tarefa que eu precisava cumprir – elas se acumularam, de novo. Peguei o violão e notei que já não sabia tocar a música que eu mesma compus.
E a verdade que eu não confessei para o meu espelho é que todas essas pequenas-crises-da-vida-adulta só servem para mascarar as grandes-crises-da-vida-adulta: o vazio existencial, a constatação cruel de que todas as pessoas – mesmo as pessoas que você eu amo – vão me magoar algum dia, o pânico da selva de pedra e a minha insuportável e exagerada autocrítica.
Eu não uso sapatos de verniz, não compro legumes aos sábados, não preparo sopinhas saborosas em noites frias, não sei me comportar em um primeiro encontro (não sei me comportar em encontro nenhum, para ser honesta) e também não uso roupas adequadas (a não ser que pijama ou camisetas customizadas e manchadas na máquina de lavar contem como roupas adequadas.)
Às vezes eu almoço no fast-food. Passo uma semana sem lavar a louça. Às vezes eu não cumpro as minhas deadlines (geralmente quando estou ocupada com crises existenciais precoces). Não tenho um amor de cinema, plantinhas bem cuidadas na varanda ou projetos futuros milimetricamente traçados.
Você sabe, a gente vive como dá.
Um dia eu acordo amando as pessoas e com aquela inabalável fé na humanidade e em dias melhores. No outro as pessoas me irritam só por existirem (todas elas, sem exceção).
Às vezes eu sorrio para desconhecidos, é verdade, mas há dias em que eu acordo e me sinto um pedaço de merda. Então eu preciso escolher entre continuar me sentindo um pedaço de merda ou abrir a janela, deixar a luz entrar e tentar ficar bem.
E – whatever – às vezes eu não abro janela nenhuma. Eu não lavo o rosto, não ponho uma roupa limpa, não tomo um chá quentinho, não tento me subornar com pensamentos positivos e chocolates… Eu não me forço a ser essa mulher madura que está sempre de pé. Eu me dou o direito de cair. Eu me descabelo sim. Eu choro no elevador sim. Eu aceito minha fragilidade – e é só isso que me salva do terror de ter que ser sempre aquela que supera. Me desculpem, mas às vezes eu só desisto.
E tudo bem. Amanhã é outro dia. Eu vou chorar a noite inteira e amanhã – ou depois – eu vou começar tudo de novo, porque eu sou realmente boa em recomeços, embora nem sempre.
De vez em quando eu surto mesmo. Pra não surtar de vez, escrevi.