Admitamos: a monogamia está agonizando. Os velhos modelos de relacionamento têm provocado riso em muitos – talvez um riso de desespero, tal qual o riso dos brasileiros contentes.
Até a indústria se apropriou disso.
Há aplicativos que são literalmente cardápios de pessoas e há outras pessoas ganhando dinheiro com esses aplicativos. Se isso não te parece muito Black Mirror, não sei o que pode te parecer.
Aliás, nossa geração comodamente solteira já tem preguiça até do cardápio.
Enjoei do Tinder há meses. Foto de homem sem camisa: passo. Descrição misteriosa engraçadinha: talvez, mas hoje não. Cara de quem não se importa: quero, talvez amanhã. Foto no carro do papi: chega por hoje.
Prefiro quem é limpinho, entende meus vícios ama gatos e pega minhas referências e mora perto. E isso é frio, como é fria a geração fast food, mas, como dissemos: admitamos.
A autossuficiência, inclusive, é regra: todo mundo tem os seus bichos e os seus edredons e suas contas próprias ou surrupiadas da Netflix para os sábados de tédio. Todo mundo estuda alguma coisa que meio que não sabe se quer estudar, só pra distrair. Eventualmente as pessoas têm sonhos, embora sejam raros os sonhos, tal qual o amor. Mas todo mundo ri de memes e ganha likes e sutis flertes virtuais nas redes sociais. Ser solteiro é fácil e cômodo.
Quanto ao amor, não se sabe se é inexistente, raro demais ou apenas difícil de identificar.
A única monogamia possível diante disso é a monogamia tácita, que ninguém envolve em acordos desnecessários, porque ninguém tampouco compreende: é quando você transa com uma pessoa só simplesmente porque você quer transar com uma pessoa só. Porque é bom e confortável.
Talvez você queira ir ao cinema com outra pessoa. Conversar com outra pessoa. Desenvolver projetos artísticos com outra pessoa. Tomar um porre homérico com outra (s) pessoa (s).
Mas há alguém para quem você vai querer voltar porque está acostumada com o cheiro e com a textura da pele e fim – somos animais, embora sentimentais. E então será estranho transar com outra pessoa (ou eu sou ligeiramente careta).
Precisamos reinventar o amor quando, desprezando o modelo falido de monogamia, encontramos um novo jeito de vivê-lo plenamente: nos detalhes.
É por isso – e não por frieza, muito pelo contrário – que rótulos são obsoletos. Nada contra, eles apenas não servem pra nada diante das tantas garantias que a gente ganha com a reinvenção o amor.
Namorado, namorido, amigo com quem a gente transa de vez em quando, amigo com quem a gente já transou e não transa mais, aquele que não é namorado – mas também não é só amigo, e você gosta mesmo assim – : não importam muito os rótulos, porque são todos e todas parceiros de vida, e esta é a única garantia do amor – se é que há alguma – e só enquanto ele durar, porque ele é finito, como a vida.
“No futuro o amor e a liberdade serão como num filme.” E quem sabe hoje seja o futuro.