Acordei decidido a escrever um texto doce feito quindim, desses que causam tempestades de curtidas e coraçõezinhos e fazem a vida, ao menos por alguns parágrafos, ficar mais parecida com aquela dos contos de fada. Logo desisti, porém. Mesmo sabendo que a realidade, quando escancarada, quase nunca é compartilhada – o povo gosta mesmo é de happy ending, de preferência com chuva de arroz -, eu me sinto obrigado a expor a verdade, doa a quem doer: a vida muitas vezes é um limão difícil de engolir, de provocar caretas e encher os olhos de lágrimas.
“No fim tudo dá certo, e se não deu certo é porque ainda não chegou ao fim”, afirmou o Fernando Sabino, e dele faço questão de discordar: há sempre uma possibilidade de as coisas não darem certo, de você passar sua existência sem encontrar o amor com o qual sonha desde o colégio, de nunca – nem depois de muito insistir – conseguir transformar seu hobby em ganha-pão, de seu coração falhar antes de você compreender que existem mais variáveis envolvidas na realização dos seus sonhos do que você gostaria; fatores que independem do quanto você quer e sua a camisa para conseguir.
Não entendeu ainda? Serei mais objetivo: a vida às vezes é um cu, e não estou falando daqueles cus que nos recebem fácil, de maneira envolvente, sem contrações que os tornam verdadeiras fortalezas impenetráveis; falo de cus ingratos que lançam “bombons” em nossa cara de repente, mesmo depois de termos seguido à risca “as dicas infalíveis para o sucesso” que vivem a ser divulgadas por gente que ignora – ou faz questão de maquiar – a chance sempre iminente de tudo não dar em nada, da bosta aparecer do nada sob o sapato recém-engraxado quando não há torneira por perto.
E antes que me pergunte por que troquei minhas tradicionais colunas açucaradas de amor por este balde de água fria, respondo: a ciência da existência de certas possibilidades, mesmo as ruins e incontroláveis, pode tornar a vida de algumas pessoas que vivem no Walt Disney Word muito menos frustrante. Parece irônico, eu sei, porém, acredito que colocar a probabilidade de dar errado sobre a mesa é uma forma de evitar grandes baques com os quais é muito difícil lidar. Afinal, quando leio coisas como “um dia você vai encontrar um amor que vai completá-la, acredite” ou “se fizer com amor, com certeza vai dar certo”, não consigo deixar de pensar na galera que sofrerá pacas porque passará a carregar esperanças nem sempre capazes de serem correspondidas. Saca?
Ando, mais do que nunca, a favor da honestidade, mesmo aquela que se parece brutal à primeira ouvida. Por que não jogar a real e preparar as pessoas àquilo que terão de encarar cedo ou tarde, então? Em vez de ilusões que não passam de vales-decepção, por que não dizer “se fizer com amor, há mais chances de dar certo. Não existem garantias, contudo!”?
A vida, além de potencialmente azeda, como já disse, não é como comerciais de marcas esportivas nos quais basta querer muito para conseguir. “Impossible is nothing”, diz (ou já mudou?) a Adidas, causando imenso sofrimento em muita gente que precisa, de fato, ouvir a verdade a respeito da existência de limites pessoais intransponíveis.
E antes que me chame de “amargo”, “trevoso”, “ouvinte de A Tempestade, da Legião Urbana” ou algo do tipo, afirmo: minha intenção com este texto – que dificilmente bombará tanto como outros mais utópicos e fofinhos que escrevi – é acordar os tantos alienados que, por causa de novelas e comédias românticas, nem imaginam do que a vida – muitas vezes bela, não nego – é capaz.