No banheiro da firma encontro uma colega contando todos os planos e “dores de cabeça” – como ela própria define – que está tendo na reta final dos preparativos “que nunca terminam” de seu casamento, programado para dali a duas semanas. Entre a lista de presentes, lembrancinha pra madrinha, lembrancinha pra padrinho, havainas com uma foto do casal de lembrancinha para os convidados, roupa da daminha e provas de bolo e docinhos, pergunto para a noiva atarefada se ela sempre teve vontade de se casar. Ela responde:
– Nunca tive muuuita vontade de me casar na igreja, mas ai chegou a hora e a gente pensou “ah, vai ficar estranho se casar só no civil, né?”. E se casássemos no religioso aí a gente sai da igreja e vai fazer o quê? Comer uma pizza?
Desde que nascemos somos pré-programados para seguir um plano. Você nasce, é batizado, se é menino brinca de carrinho, se é menina brinca de boneca e casinha. Vai pra escola, pra faculdade, começa a namorar, consegue o primeiro emprego, compra a casa própria. Casa, tem filhos e assim pode viver feliz pra sempre. É um roteiro que temos inconscientemente criado em nossa mente. São tipo os sete passos para ser feliz. Se você desvia desse plano, pula etapas ou opta por alternativas “fora do convencional”, não são raras as perguntas que os parentes e conhecidos regurgitam sobre nós: “Você não tá namorando? Vai ficar pra solteirona? Não vai casar? E quando você vai dar um netinho pra sua mãe?”.
Desde a época em que brincávamos com a tal boneca e cuidávamos da casinha essa vontade começa a ser criada em nós, mulheres. Somos ensinadas que temos que cuidar bem da boneca, a montar casinha, que a Barbie sempre casa com o Ken e que, para a princesa ter o seu final feliz nos contos de fadas, ela tem que ganhar um beijo do príncipe. E isso fica na cabeça. Quantas mães não falam, quando a gente é criança, que não vêem o dia de nos ver entrando de noiva na igreja? E as pessoas vão aos poucos incorporando essa idéia. É uma imposição da igreja, de muitos anos atrás, que já se impregnou no ritmo da sociedade.
Na igreja católica o casamento é um sacramento, um juramento, um pacto, um contrato espiritual que tem como condição a jura de amor eterno, o “até que a morte os separe”. Agora me diz: como eu, um ser humano, imperfeito como sou, que não sei prever nem o que vou querer pro almoço no dia seguinte, poderei jurar que meu amor por outra pessoa irá durar pra sempre?
Grande parte das mulheres ainda cultiva o sonho do contrato matrimonial. Porque o casamento não deixa de ser uma grande festa bonita, uma celebração do amor dos noivos. E geralmente as mulheres gostam disso, de mostrar pra todo mundo que ela é, e vai ser feliz. Tem mulheres que sonham tanto com o dia do seu casamento que isso vira até uma obsessão “preciso casar na igreja”. Elas só se sentirão felizes se em suas vidas chegar o dia de subir no altar. Tem até as bridezillas (bride + Godzilla) que ganharam esse apelido por ficarem tão neuróticas nos preparativos para o casório. Enquanto na cabeça da noiva se passam as mais diversas dúvidas e inquietações na preparação da festa, na do noivo a única dúvida que impera é: “será que vai ter coxinha?”.
Eu defendo totalmente a vontade de duas pessoas que querem ficar juntas e oficializar esse relacionamento. Afinal, nos dias de hoje você só casa mesmo, se quiser. Lembram da máquina de lavar? Então, nada mais obriga um homem a querer ficar com uma mulher – e vice-versa –, se não for pela vontade própria.
O que me intriga é a hipocrisia de um ritual defasado como o da igreja católica. Acredito que muitas pessoas ainda embarquem nessa porque é bonito, porque tem fotos, porque é um dia que fica marcado para celebrar esse amor, mas simplesmente ignoram o verdadeiro sentido que o casamento tem na igreja. Que pra usar o tal vestido branco a moça deve ser virgem e “pura”, e que separação é algo que não existe, é juntos – felizes ou infelizes – para sempre.
Vemos pessoas gastando um monte de dinheiro – o que tem e muitas vezes o que não tem – para fazer uma festa para agradar os outros – sendo que sempre tem gente que sai reclamando – e ir morar em casa alugada, ou pior ainda: voltar a morar com os pais. O que não consigo compreender é essa vontade de agradar os outros, de fazer uma festa para os outros, sendo que o amor é meu e seu. De ter que se moldar em padrões pré-estabelecidos para se enquadrar numa sociedade de aparências, onde o que vale é parecer feliz. Quando na verdade não tem certo nem errado, não tem amar mais ou menos. Cada um tem a sua forma de amar e ser feliz da maneira que melhor entender. Sem fotos posadas.