No dicionário das relações amorosas, ser humano é sinônimo de carência. Todo ser guarda em si um vazio desde que largamos da barra da saia da nossa matriarca, que precisa ser completado para que a gente se sinta bem. Algumas pessoas o preenchem com comida; outros com gatos; outros com compras; mas a solução mais amplamente usada pra rebocar as crateras do coração cavadas pela solidão é um amor pra chamar de seu. Talvez seja por isso que quando achamos alguém que nos conhece profundamente, e que mesmo assim gosta da gente, temos medo de perdê-lo. Já que colocar uma coleira com seu nome no pescoço do outro está fora de cogitação (a não ser pra Luma de Oliveira), ficamos sempre buscando formas de laçar o outro sutilmente, com amarras quase invisíveis. Uma dessas amarras é o ciúme – aquele sentimento encoleirador, que nos dá a falsa sensação de perecimento e que faz com que as pessoas se comportem como maníacos, querendo controlar até o que o outro pensa. Um dos efeitos colaterais do ciúme é fazer com que o sujeito fique com uma visão turva e distorcida da realidade, jogando uma culpa no outro que é produto de uma imaginação fértil. Um dos sentimentos mais confundidos, principalmente quando se trata de pessoas ciumentas, é desejo com atração. Pode não parecer, mas eles são bem diferentes.
Ele vê aquela mulher de pernas gostosas que trabalha no restaurante em frente: atração. Ela acha estilosa aquela tatuagem na panturrilha dele: atração. Ele acha a boca dela interessantemente carnuda: atração. Ela acha a barba dele um charme: atração. Ele acha os peitos dela bonitos: atração. Ela vê o volume entre as pernas dele e acha que ele tem potencial: atração.
Agora, note a diferença:
Ele vê aquela mulher de pernas gostosas que trabalha no restaurante em frente e fica tentado a convidá-la para sair: desejo. Ela acha estilosa aquela tatuagem na panturrilha dele e fica molhada de vontade de vê-la mais de perto, de preferência na cama dela: desejo. Ele acha a boca dela interessantemente carnuda e fica sonhando em como seria tê-la tocando no seu pinto: atração. Ela acha a barba dele um charme, e sonha em poder dar uma roçada nela: atração. Ele acha os peitos dela bonitos e tem uma ereção só de imaginá-los em sua boca: atração. Ela vê o volume entre as pernas dele e acha que ele tem potencial, e fica pensando como seria tê-lo dentro dela: atração.
Os exemplos acima são meramente ilustrativos, mas servem de comparativo para entendermos melhor a diferença entre desejo e atração.
Atração é aquela coisa que só os hipócritas não sentem. Nos atraímos pelo que consideramos belo ou interessante em algum sentido. Ou seja – você pode se sentir atraído por um carro, por um quadro, por um prédio, por uma cachoeira e, como não poderia deixar de ser, por uma outra pessoa. Precisamos dessas referências de coisas inspiradoras pra que a nossa vida seja interessante. O mundo seria um lugar chato se só nos cercássemos de coisas e de pessoas feias, negativas, baixo-astral, sem cor. O belo – lembrando que ele adquire um conceito pessoal para cada pessoa – nos alimenta, nos mantém vivo, nos motiva, portanto se sentir atraído pelo mundo e por tudo que faz parte dele é natural. Jamais devemos deixar que outra pessoa nos prive desse direito.
Agora desejo é diferente. Desejar significa querer ter para si. Desejo implica num movimento, em atitudes que te aproximem do seu alvo. Ou seja, ter atração por uma bomba de chocolate significa que você acha que ela é um doce interessante. Ter desejo por uma bomba de chocolate significa que você vai fazer de tudo para tê-la – até sair no meio da madrugada, numa noite fria, pra ir atrás dela. Desejo vem junto com a intenção, com a vontade de fazer. Quando um pensamento – seja ele direcionado a uma pessoa ou objeto – não sai da sua cabeça até que você se mova para consegui-lo significa que você deseja, e não somente tem atração.
No nosso ponto de vista, num relacionamento monogâmico com acordo de exclusividade, desejar outra pessoa pode ser muito nocivo. É desleal estar transando com a pessoa que você escolheu pra chamar de sua, mas na verdade estar com vontade de transar com outra. Ou dormir abraçado, sonhando com a sensação de estar abraçando um outro corpo. Por mais que você se controle e que tudo fique apenas na sua mente, esse foco direcionado a um terceiro pode fazer com que você desperdice energia que poderia estar gastando quem você escolheu. Afinal, se todos temos direito ao livre arbítrio, qual o sentido de estar com uma pessoa, porém desejando outra?
Agora, permita-se sentir atraído por outras pessoas, e não prive seu amor de fazer o mesmo. Não seja uma louca (ou louco) controlador que quer sufocar até mesmo esse direito que não lhe diz respeito. Permita-se inspirar com as belezas do mundo – inclusive com as pessoas – e saiba que estar do lado de alguém que faz o mesmo é muito mais divertido. No dia em que tudo lhe parecer cinza e nada mais lhe parecer belo, então desocupe a vaga e deixe-a pra alguém que ama mais a vida. Afinal, a vida só é bela pra quem gosta dela.