Ela revirou o casaco dele a procura de um fio de cabelo. Será que ela é ruiva ou morena? – perguntava para si mesma. Farejou a roupa como um cão, em busca de um perfume diferente do seu. Vistoriou o colarinho em busca de resquícios de uma noite com uma mulher qualquer. Uma mancha de batom o denunciaria – por menor que fosse, confirmaria o que sempre desconfiou. Ela usaria fragrâncias cítricas ou florais? Será que ela gosta de morar no pescoço dele como eu ou será que, ao invés disso, ele é que implora pelo cheiro da nuca dela? Procurou pistas também no bolso, talvez um telefone anotado em um guardanapo de bar fosse o álibi perfeito para vomitar em cima dele toda a sua desconfiança, insegurança e medo. Mas só encontrou um Trident de canela, um isqueiro branco, algumas moedas e um cupom fiscal da pizza de quatro queijos que comeram ontem à noite, quando comemoraram três anos de namoro.
Poderia ser o prefácio de um livro que você retirou da cabeceira para ler naquela quinta-feira em que o sono teimou em não aparecer. Também poderia ser a história daquela série da Fox que você não perde por nada nesse mundo, mas, infelizmente, é a histórias de muitos.
Os sinais de insegurança começam quase imperceptíveis. “Qual a senha do seu celular?” E aquela simples combinação de quatro dígitos transforma seu celular em um passaporte para o fim da relação. É uma passada de olhos pela caixa de entrada do e-mail, uma xeretada rápida e habitual nas mensagens do Whatsapp, Messenger do Facebook, InstaMessage ou qualquer outro aplicativo que possibilite uma conversa em off. E aí pronto: uma simples conversa com algum amigo seu pode ser interpretada de maneira errada, e a confiança vai para o ralo. Nasce um sentimento de posse, e você acredita que o outro lhe pertence. Sente um frio enorme no estômago – devem ser as tais borboletas – quando imagina a possibilidade de ser deixado. Segue os olhos do outro e tenta decifrar o que se passa naquela cabeça. Deixa de ser inteligente, deixa de lado suas vontades, falta na aula de Antropologia, mesmo estourado em faltas, envia torpedos o dia todo e quando não é inserido em todos os compromissos se sente deixado de lado, faz biquinho e chora. E de repente, de tanto abrir mão de você mesmo, chega o momento em que o espelho cruza o seu caminho, vocês se encaram e você nota que existe um ar de cansaço e que nem você se reconhece mais. O cabelo está mal tratado, a pele seca, o sorriso não parece nem de longe com o seu e o brilho nos olhos parece ter sido abduzido. Você tenta se reconhecer, mas contrariou tantas vezes as suas vontades, que nem lembra mais do que gosta.
Chega! Amores destrutivos corroem a saúde física e emocional. É paulada atrás de paulada na autoestima. É desdenhar de si mesmo e colecionar migalhas. É colecionar fantasmas, desconfiar de você mesmo e escolher o caminho da infelicidade. Porque o mínimo necessário para levar um relacionamento adiante não é um sentimento incondicional e avassalador, mas algo muito mais simples do que isso: a confiança. Procure e queira só o que vier inteiro e transbordando. E se o que você encontrar pelos caminhos da vida for um amor destrutivo, que só consegue te oferecer uma gastrite e uma boa dose de perturbação, lembre-se de que a doce solidão lhe oferece um universo inteiro de possibilidades. E até encontrar um novo par, é necessário abrir os olhos, contrariar Tom Jobim e cantar: “É possível ser feliz sozinho”.