Um dos maiores fantasmas dos relacionamentos amorosos é quando uma das partes dos casal (normalmente as mulheres) chama a outra para discutir a relação. O fato curioso é que um aliado que poderia ser muito positivo já de tornou motivo de chacota e até descaso, afinal fazer uma DR parece que virou algo pesado, chato e obviamente indigesto.
Creio que existam motivos para que essas conversas tenham se tornado um pesadelo para as pessoas e vou tentar explicar:
1. Não fomos educados a argumentar.
A educação latina e em especial brasileira não tem a cultura de resolver suas questões e impasses usando a palavra. Somos passionais e corporais para nos comunicar e o que é dito não é levado muito à sério. Pedimos desculpas balançando a mão e nos reconciliamos com afagos. Os problemas de fundo permanecem ali gestando futuras confusões maquiadas de outro jeito. Na hora de um debate nós exageramos, generalizamos, apelamos para sentimentalismos e raramente lidamos com a questão pontual. Falamos pelas beiradas, usamos falácias lógicas e tememos um desacordo amistoso, tudo soa pessoal e agressivo.
2. As DR’s são usadas para atacar pessoas
Existe uma tendência personalista ao abordar um problema amoroso que parte da premissa que se um impasse acontece no casal a responsabilidade é de uma pessoa e não da dinâmica da relação. Ciúme, raiva, sentimento de inferioridade, apesar de serem experimentados individualmente são sempre casamentos de duas intenções que se alinham para alimentar aquele sentimento. Prova disso é que uma pessoa nos desperta certas emoções e outras não. Se a dinâmica for abordada as pessoas se sentem mais livres de confrontos pessoais e ficam menos defensivas.
3. As DR’s são ferramentas de acusação
Se a culpa for o ponto central da discussão inevitavelmente haverá um culpado. E se há um culpado a acusação e a punição serão decorrências naturais. Mas se o problema for a forma com que as relações acontecem o que será abordada será a interação e ambos estão implicados. “Me senti desconfortável quando nos comportamos de maneira ciumenta. Como será que esse ciúme pode ser melhorado?” Toda vez que alguém é acusado inevitavelmente irá se fechar, recuar e contra-atacar, ou seja, o objetivo de ganhar intimidade e harmonizar a relação se transforma em aumento de munição para próximas brigas.
4. As Dr’s supostamente buscam soluções
Se o problema de um relacionamento é colocado em pessoas e não na relação então a solução é sempre algo como “se vira aí com seus demônios” e não “seremos parceiros que trabalham juntos na superação do medo de nos distanciar”. Normalmente quando um casal está em crise eles não recorrem um ao outro mas um contra o outro. Ninguém se dá conta que a dor é mútua e as limitações surgem de bloqueios, receios e vulnerabilidades difíceis de serem compartilhadas com quem se ama. A solução surge da cumplicidade de observar a essência do problema e dar um tempo para que novos ajustes sejam feitos. Mas se o casal apenas quer ganhar vantagem um sobre o outro nenhuma solução é possível.
5. As DR’s são palcos de egocentrismo
É muito raro a DR partir do pressuposto que a pessoa de comportamento problemático tem uma dificuldade e precisa de ajuda. Normalmente queremos que o nosso lado seja olhado e atendido e a outra pessoa colocada no lugar de vilã. Estamos sempre perguntando “e eu?” ou “você faz dívidas e eu me sinto uma merda, agora terei que fazer hora-extra pela décima vez que você se descontrola” e nunca “como você tem se sentido diante dessa dificuldade financeira?”.
6. As DR’s são carregadas de intenções negativas mascaradas de boas
Apesar do motivo aparentemente nobre da DR elas guardam motivações ocultas como causar culpa, fazer chantagem, criar sentimento de inferioridade e inverter um jogo para quem domina o outro moralmente na relação. Se o casal não tem clareza das suas reais motivações a reação será sempre desastrosa.
7. As DR’s acontecem em momentos inoportunos
O pior momento para discutir a relação é quando uma das partes está alterada emocionalmente. Normalmente o resultado é ruim e cria uma associação entre desequilíbrio e falar sobre o relacionamento e ninguém vai querer repetir a dose. Para conversar sobre algo é preciso um clima de intimidade, bem-estar mínimo e cumplicidade, mas todo mundo aproveita essas horas só para curtir o que há de bom e não em tocar nos assuntos espinhosos com gentileza, sorriso, cafuné e chamego. Com o tempo dessa boa prática a associação ruim diminui e não parece ameaçadora.
8. O tom das DR’s são catastróficos
O desespero não é uma boa base para uma conversa madura, pois ele criara cenários sempre exagerados e dramáticos. É preciso muito pé no chão e equilíbrio para não ser reativo às suas próprias emoções e receios do outro. Na hora de conversar não faça um drama mexicano, crises não são o fim do mundo a menos que você queira tudo para ontem.
9. O amor não pode ser frágil
Quando os casais se unem a paixão se apega às virtudes e os pontos fortes da pessoa amada. Esse condicionamento cria uma base enganosa de que o amor se apoia no lado bom da vida e rejeita os defeitos e fragilidades do outro. Com o tempo a pessoa amada se sente menos impelida para mostrar sua fragilidade sob o risco de perder a admiração-tesão da outra pessoa. Portanto, se você quer inspirar abertura emocional precisa considerar amar a pessoa inclusive com suas incapacidades fundamentais.
Para que todas essas coisas funcionem não se pode esperar sabedoria das duas partes, principalmente se algum dos lados tem menos maturidade emocional. Então quem precisa puxar a dianteira de uma DR saudável é quem tem mais clareza e lucidez. Assim como esperar que a pessoa menos madura se ajuste de imediato não será uma expectativa realista.
Portanto, reveja suas posturas e dê um tempo de pelo menos um ano para a reabilitação completa acontecer, afinal, resultados rápidos só acontecem em relacionamentos fast food, daqueles que as pessoas se amam num dia e terminam no outro.