Desde pequena ela ansiava pelo vestido branco cruzando os corredores da igreja em busca do homem que poderia chamar de seu pelo resto de suas vidas. Pintava as bonecas com a cor do seu batom predileto, os olhos brilhavam como dois diamantes quando o sapato branco cintilante aparecia na TV, enrolava-se em trapos espalhados pelo quarto de costura da sua avó e já adolescente imaginava se casar com a paixonite do colégio que sequer sabia da sua existência. Cresceu alimentando cada pedacinho do seu sonho até que ele criasse a forma de sorrisos e felicidade palpável, e deixou que as prestações do cartão de crédito sofressem caladas os obstáculos travados pelo caminho. Poderia ter comprado um carro com o dinheiro da festa, já dizia uns. De fato. A questão é: esse carro te conduziria àquele momento tão esperado?
Um carro novo, uma festa de casamento, uma viagem ao exterior, uma pós-graduação fora do país. Sonho é uma coisa tão peculiar e individual que é até difícil imaginar quais sejam as ambições e os anseios de cada pessoa que nos rodeia. Isso porque desejo é algo muito íntimo, uma conquista que pode parecer bobagem aos olhos dos outros pode significar absolutamente tudo dentro da história da gente. Paga-se os impostos financeiros e emocionais com a maior alegria do mundo, porque sabe-se que ao final de tudo, todos as dificuldades terão valido a pena. O coração segue livre para outros sonhos, outros caminhos, novas travessias, e o que fica é justamente o que foi percorrido, como aquilo nos fez sentir, e quem levamos dessa trajetória para dar continuidade à viagem.
O que eu vejo de gente criticando o sonho do outro não é brincadeira. Aparecem contadores, economistas, palpiteiros, fofoqueiros, investidores, gerentes, uma quantidade de gente que acha que sabe o que é melhor para você que não tem cabimento. E entre essas e outras muitos sonhos se perdem na opinião alheia, de quem não faz nem ideia de qual seja o seu nome do meio, quiçá o que te faz sorrir. O que é que tem se você vai gastar toda a sua poupança na entrada daquele carro cheirando a novo que você sempre quis, se com o dinheiro investido naquela viagem com as amigas de infância você poderia ter reformado o seu guarda-roupa, ou se a sua festa de 30 anos com tudo o que você tem direito custou mais do que uma criança no seu primeiro ano de vida? Dinheiro vai e vem, determinadas oportunidades não.
Vivemos um momento recheado de parcerias instáveis, sentimentos vulneráveis e, particularmente, bastante delicado economicamente. Mas a vida é uma só e ela continua girando independente de todas as intempéries da estrada. Minha avó já dizia: “carro apertado é que anda”. Pois bem, não dá para ter medo de viver. A gente pega a vontade, a disponibilidade, os recursos, e vai à luta. Uma cerveja que se deixa de beber ali, uma roupa que se deixa de comprar aqui, de migalha em migalha em algum momento se faz o pão. Sonho não tem preço, não importa o quão grande seja o seu.
Toda vez que um sonho é deixado de lado o sorriso de alguém morre junto. Não estou incentivando loucuras, muito menos jogar tudo para o alto e ir em busca de uma realidade completamente nova (ou sim). Temos contas, responsabilidades, filhos, certamente uma infinidade de problemas que dependem da gente para serem solucionados. Apenas estou dizendo que se é minimamente imaginável, concretize. Sonhe, idealize, poupe, se dedique, porque é isso o que faz os dias valerem a pena, é disso que você vai se lembrar com nostalgia quando estiver observando os seus netos brincando no parque. É o poder sonhar que dá sentido à vida.
Comece dando pequenos passos para sentir a firmeza do chão que te espera e quando se sentir mais confiante, voe. A maioria dos obstáculos que nos impedem de seguir adiante são puramente emocionais, como a figura emblemática do cavalo robusto amarrado a uma cadeira de plástico. Pode chover pelo caminho sim, mas um pouco de água nunca fez mal a ninguém. Pega a chuva e dança meu bem, que o arco-íris que vem depois só tem o gosto da esperança para quem sentiu na pele cada pequeno pingo da renúncia mais doce que existe: a que te permite realizar (e ser feliz).