• Em um mundo programado,  sentir é um ato revolucionário
  • Em um mundo programado,


    sentir é um ato revolucionário


    Era um fast-food qualquer.

    – Temos uma oferta de Big-Cheddar-AVC por apenas 15,90, senhora.

    (Só o sorvete, obrigada).

    – Água por mais $1, senhora?

    Senti como se estivesse sendo atendida por um robô programado para sorrir e repetir incansavelmente: aceita, senhora?

    Pensei que talvez todos nós sejamos como atendentes de fast-food e telemarketing: programados para fazer o que tem de ser feito. Todo o resto paira no mundo a nossa espera, sem que percebamos.

    É difícil sair desse ciclo e fazer exatamente o que queremos fazer. É difícil decidir ouvir uma música quando precisamos trabalhar. É difícil pensar sobre o outro quando julgá-lo é tão mais simples.

    O ciclo da vida vai se repetindo em cada pessoa que conhecemos. A escola, o primeiro beijo, a faculdade, o casamento, a academia, as viagens de férias, os filhos e a aposentadoria… é tudo tão previsível.

    Vamos nos tornando previsíveis em cada detalhe. Nossos amores tornam-se convenientes. Entramos para a turma das pantufas, dos sucos-detox e do conforto. Vamos vivendo tão confortavelmente que estranhamos qualquer desafio.

    Poucas vezes estamos de fato em contato conosco e com o outro. Na maioria do tempo, nos ocupamos em fazer o que é certo, o que nos conduzirá à faculdade, ao casamento e à aposentadoria – e nos esquecemos que, nesse meio tempo, é preciso viver.

    É preciso sentir, mas isso é tão simples que nos tornamos inábeis.

    Revolucionamos a nossa própria existência quando nos recusamos a deixar que o mundo nos passe despercebido. Quando tiramos nossas máscaras de conveniência somos confrontados com o mundo e somos enebriados pela entrega, só então, sentimos o que de fato significa viver.

    Aprender a sentir é um exercício diário – difícil, confesso, em meio a uma multidão de zumbis – mas extremamente gratificante. Nos tira o pesar de uma existência morta chula, vazia, inútil, e nos põe em contato com o que realmente nos coloca no mundo.

    E o que nos coloca no mundo são as nossas crenças, os nossos contatos, as nossas viagens, os nossos desejos mais íntimos; nós mesmos nos colocamos no mundo quando nos recusamos a fazer apenas aquilo que se espera.

    Somos colocados no mundo quando aprendemos a sorrir para a atendente quando ela nos oferece uma água por mais $1, e, quem sabe, mostrá-la que ainda há contato humano a despeito do texto pronto que precisa ser dito.

    Somos colocados no mundo quando pensamos sobre as pessoas e as compreendemos, antes de julgá-las, antes de submetê-las ao cruel teste de entrada em nossas vidas; quando não boicotamos nossos sentimentos mais insanos, quando obedecemos as nossas vontades mais incompreensíveis, quando usamos o nosso tempo para a única coisa que interessa, no fim das contas: compreender a nossa própria alma.

    Diuturnamente, somos confrontados com a frieza humana. Mas isso não significa que precisemos abraçá-la.

    ass-nathalie


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