Todo mundo quer o amor, mesmo que não prioritariamente. O que pode uma criatura, perguntou Drummond, entre outras criaturas, senão amar?
A minha geração responderia a essa pergunta ao seu modo debochado e nada poético: a criatura, Drummond, pode ver filmes e séries, pedir uma pizza marguerita, rir com memes na internet, encher a cara, manter os contatinhos e trepar com um deles quando a carência bater.
A minha geração, a essa altura, já deve ter percebido que isso não funciona muito bem, porque depois da pizza e dos contatinhos e do último episódio da série, a gente ainda quer o amor, e é realmente lamentável que eu tenha pensado agora mesmo em escrever um complemento pra isso, algo que explicasse por que querer o amor, como se querê-lo demandasse explicações, como se amar não fosse, como disseram tantos outros poetas depois de Drummond, a coisa mais obviamente humana de nossa existência.
Acontece que a minha geração não parece muito familiarizada com o amor. Temos o Tinder, que culpa temos nós? Assistimos ao declínio do casamento como instituição – muitos de nós assistimos ao declínio do casamento de nossos pais, a título ilustrativo -, somos contemporâneos ao amor líquido e o sexo, para nós, se tornou aquela coisa que tem menos a ver com tesão do que com ego e ainda menos a ver com amor.
A verdade é que a gente quer o amor, porque todo mundo quer o amor e não há problemas em querer o amor. O problema é que a gente tem preguiça do resto. O problema é que a gente tem culpa, sim.
A gente tem preguiça dos inícios e medo dos finais. A gente sai correndo quando o amor se aproxima em um raio de 100m porque a gente sabe que vai começar tudo de novo: a lua-de-mel, a estabilidade, as queixas, o horror e o fim. Somos práticos demais para um ciclo tão repetitivo.
Somos uma geração de fóbicos, romantofóbicos, romanticidas sem remissão. A geração da individualidade, que compartilha posts e memes e músicas e parece incapaz de compartilhar-se com o outro.
Mas a gente ainda tem a pachorra de querer o amor. A gente quer um cafuné no fim de um dia cansado, um daqueles que fazem a gente sentir que não importa o que aconteça, está tudo bem. A gente quer alguém que nos compreenda mesmo nos dias em que somos incompreensíveis para nós mesmos. A gente quer os planos partilhados e as conchinhas que fazem o resto do mundo desaparecer.
A gente quer essas coisas que só o amor faz, e eu tenho uma péssima notícia pra a gente: o amor dá trabalho.
Envolve demandas emocionais e o contato real com um universo inteiro e complexo que não é o seu. Você precisa doar o seu tempo e a sua paciência. Precisa sair da zona de conforto pra buscar o amor lá fora, do lado de fora do seu mundo, esse lugar tão alienígena e assustador.
Você precisa cultivar o melhor em você e no outro. Precisa aturar as crises do outro, relevar as manias do outro, sorrir para os primos chatos do outro, lidar com as inseguranças do outro. No amor, você precisa enxergar o outro, e se há uma coisa de que nossa geração entende menos do que o amor, essa coisa é o “outro”.
Somos egocêntricos demais pra esse negócio de amor, então a gente prefere deixar pra outro dia ou, quem sabe, deixar pra lá.
Você sabe, Drummond, pode não sobrar tempo para as séries, para os contatinhos e para a pizza margherita.