Minha avó sempre disse que só morria afogado quem sabia nadar e eu, pirralho leviano, nunca entendi muito bem de onde ela tirava aquela lógica falha dela. Uns tempos depois, comecei a entender o que o tal ditado significava: você só vai entrar no mar se souber o que tá fazendo ali. Se tiver medo, você nem vai se arriscar em entrar.
Foi aí que eu percebi que o medo é igualzinho a uma moeda e tem dois lados. Obviamente a maior parte de nós encara o medo como um mal congelante. Algo que só serve pra frear nossa vida, podar nossas escolhas e arruinar as possibilidades que temos para o futuro. Medo também serve pra catarse: quantos filmes de terror você não viu por precisar gritar e se assustar pra botar alguma coisa pra fora? O riso que segue o grito constrangedor do susto é hilário.
Mas o medo não tem só essa vertente cruel. Medo também é ponderação. Quantas vezes você evitou fazer alguma bosta que era claramente uma bosta por medo? Tipo botar o dedo na tomada, agarrar uma cobra ou outro animal perigoso, correr pelado no meio da rua cheia de gente e por aí vai? Medo, quando bem dosado, é sensatez. A fórmula é bem sutil, viu? Numa linha do lado de cá, você tá protegido e agindo de forma coerente. Do lado de lá, você tá evitando embarcar em algo que poderia mudar a sua vida por causa dele. Já deu pra ver que provavelmente o medo é libriano, né? E quem de nós sabe lidar com librianos? Nem eu que sou do signo sei, gente.
Olhar pro medo com menos medo – que redundância bosta, mas necessária -, fez com que eu entendesse a figura na qual ele se encaixa. É como se fosse você dirigindo com alguém querendo pegar o volante e te levar pra direção contrária. Ele vai estar ali a viagem inteira gritando no seu ouvido e tentando tomar a direção, mas você não pode deixar isso acontecer. No máximo, você manda o medo calar a boca e sentar no banco do carona. Ele vai continuar te enchendo o saco, mas não vai ter como alcançar o volante. Você vai estar no controle.
Acho que isso serve pra tudo na vida. Até pra tal pessoa que se afoga só porque sabe nadar. Ela pode entrar no mar e, quando perceber que não dá mais pé e que a corrente tá puxando, voltar atrás. Ou ela pode só botar o pezinho pra sentir a água e isso já é mais do que suficiente pra mostrar que ela conseguiria ir até o final se quisesse. Ignorar o medo completamente é burrice, é falta de prudência, é abrir mão do teu instinto natural de proteção à vida. Até porque ele vai estar ali. E você não ser rebelde e atacá-lo loucamente. Você só precisa colocá-lo no lugar dele. Assim, com ordem, com respeito, pulso firme e entendendo que ele pode ser anjo e demônio ao mesmo tempo no seu ombro. No fim das contas, é você quem decide como ele vai influenciar na sua vida. É você quem escolhe. Ele, coitado, veio nessa vida só por causa de você.