• A gente não quer só Ritalina
  • A gente não quer só Ritalina


    Algumas pessoas, têm uma capacidade incrível de superação, determinação, concentração, uma sensibilidade que parece até sobrenatural, uma força imensa e um ponto fraco, um “pontão”, bem grande que fode com tudo, que destrói seu esforço de ser equilibrado e normal. Feliz, raso, sonso, burro, tranquilo, superficial. É o buraco que te faz ser ao mesmo tempo genial e louco.

    Genial é sempre alguém que teve uma ideia que ninguém pensou e o louco é sempre alguém que teve uma ideia que ninguém entendeu. Van Gogh, Newton, Beethoven, Allan Poe e muitos outros… pessoas perturbadas por uma dor sem nome. Consideradas loucas. O que te faz um gênio? Pensa que existem muitos gênios anônimos aí fora que não sabem que o são, porque um dia alguém disse: larga disso, é bobagem! E eles obedeceram, para serem aceitos, amados, respeitados e adaptados. Angústia. Tristeza. Isolamento. Depressão. Suicídio. Provas concretas de que não nos adaptamos assim tão fácil e que o modelo nos sufoca, a vida sem sentido, o trabalho sem sentido, as relações sem sentido nos sufocam. Mais e mais. As doenças psíquicas são reais e precisam ser cuidadas. Se o sofrimento não passa, peça ajuda.

    Mas, diferente do que o século XXI prega, não temos que ser todos gênios, felizes, saltitantes e ajustados. Sim, somos todos um pouco loucos, loucos estranhos, loucos que erram, que acertam, que carregam dores, que têm medo e têm crise de dúvidas. Mas a gente precisa lembrar que quem carrega a dor somos nós e não ela que nos carrega. Lembre disso quando sentir pena de si mesmo, for algo muito irresistível e sedutor. Quando algum sofrimento nos insiste doer, tem um momento que a racionalidade precisa aparecer e nos proteger do prazer da dor compulsória. Tudo passa se a gente entender que o fim do mundo é quando a gente entende e sente ser o fim do nosso mundo interno. E que ele ressuscita se a gente for corajoso o suficiente pra abraçar a responsabilidade das nossas escolhas. Às vezes até podemos achar que não tivemos escolhas, mas nós temos. Sempre.

    Baixa tolerância à frustração é outro ponto alto dos tempos atuais. Temos tendência a acreditar que tudo são unicórnios e verdes campos de satisfação. Que se algo te demanda muito esforço e dedicação, tem algo errado. Arranjamos desculpas pras nossas características pessoais e arranjar um diagnóstico é mais fácil do que encarar seus fantasmas e, acima de tudo, bancar suas idiossincrasias.

    A loucura é sempre uma forma que a humanidade achou de taxar o diferente. Nessa altura do campeonato, já sabemos um pouco mais sobre diversidade e sobre liberdade de expressão, mesmo que esse critério (desajustamento) ainda seja aplicado de forma preconceituosa e excludente. Implicidamente somos excluídos se não estamos de acordo com a expectativa de um grupo específico, ou extremamente aceitos por estar dentro dos modelos de uma tribo. Aí mora a controvérsia da diversidade.

    Nossa melhor amiga virou a Ritalina e o DSM nosso guia espiritual. Enquanto a indústria farmacêutica vive feliz pra sempre, nós seguimos buscando um diagnóstico que explique nossa humanidade.

    kelly


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