A minha vontade era ter desligado o telefone e ter me dado dois tapas na cara pra deixar de ser tapado. Aquela coisa de oferecer o outro lado da face, sabe? Meu lado biblíco também era cínico. Eu tinha acabado de começar um relacionamento e tava receoso, o que era coisa normal pra mim. Sempre tive um certo receio em começos de relacionamento. Aquela coisa boba e gostosa de ir conhecendo a pessoa, ir alimentando as informações que vão preencher as tabelas e prateleiras afetivas, combinar programinhas bacanas que vão marcando e criando os momentos e tudo mais. Essa base inicial sempre me foi muito natural – e assustadora.
O problema foi ter ouvido o primeiro “eu te amo” da relação no outro lado da linha enquanto ela viajava de carro com uma amiga pro Nordeste. O som da estrada, um pouco da cerveja e o vento no rosto devem ter motivado a menina a esboçar o primeiro grande sinal de que as coisas realmente começaram pra mim. E eu respondi com um inesperado, suado, confuso e repentino “eu também”. Senti a broxada dela desse lado de cá e já não dava tempo de explicar mais nada. Acabei inventando algum compromisso e disse que retornaria mais tarde, mas só queria enfiar a cara na terra mesmo.
“Eu também” é uma resposta fria, impulsiva e, geralmente, vem da pressão que a gente sente em dar resposta e corresponder. Ao contrário do que a gente pensa, ele não tem o mesmo valor da frase dita com todas as 3 palavras. É como se você não conseguisse expressar o que sente e dissesse de forma genérica só pra agradar, só pra fazer com que a outra pessoa não se sinta desamparada.
Tem muita gente que não consegue botar pra fora, isso é um fato. Por insegurança ou por medo, dizer é sentir que está abrindo caminho e se deixando vulnerável. A partir do momento em que a gente diz que ama alguém, é como se uma promessa invisível fosse desenhada no ar e o peso fica. Não é um peso ruim, mas é uma forma sentimental de dizer que se importa. Seria natural querer ouvir do outro o mesmo, mas tem gente que não consegue ser claro e objetivo na hora de fazer as compras de lista no mercado, imagine como seria com os sentimentos? E lidar com os sentimentos alheios envolve mais cuidado também.
Pensando melhor sobre isso, cheguei à conclusão de também existe muita gente que se leva pela pressão da recíproca, mas não deveria. Recíproca não é algo que se cria, é algo que acontece e pode levar algum tempo até que os dois se localizem no mesmo patamar – seja de envolvimento, de segurança, de conforto em expressar o que sente. Quando a gente passa a se forçar a dizer algo por obrigação, tudo soa mais falso, menos natural e as pessoas ao redor percebem. Nos meus próprios relacionamentos, com o tempo, eu fui aprendendo a evitar o impulso e só dizer certas coisas quando realmente as sentia. Não foi o caso dessa vez.
Liguei de novo e me expliquei. Pedi desculpas pela falta de sensibilidade, ela disse que entendia, expliquei que eu sou meio medroso e que não queria ser incompleto, que no momento certo ela ouviria, porque eu também sentia aquilo florescendo aos poucos. Com uma risada gostosa do outro lado da linha e o barulho de vento, ela disse que não tinha problemas em esperar quanto a isso porque me amava. É, eu também.