• Não precisava ter sido assim
  • Não precisava ter sido assim


    Eu joguei a coisa toda no ralo, não foi? Não faço ideia do que acontece com a gente depois do fim, principalmente quando fui eu quem decretou o tal fim.

    Depois de ter reunido algumas desculpas e ligado o rádio, depois de ter acendido um cigarro na varanda do prédio enquanto você chorava no sofá me perguntando por que as coisas tinham que ser assim eu escrevi na parede do quarto com o seu batom. Eu escrevi que o mundo não é justo e o amor é menos justo ainda. Você quebrou o espelho do banheiro. Eu quebrei a gente antes disso.

    Não precisava ter sido assim, eu sei. Nunca precisa ser. As coisas terminam, mas depende da gente a forma como vai ser dali pra frente. Eu fui um tanto quanto insensível e egoísta – todos somos, aqueles que estão prestes a deixar alguém. A gente acha que ser frio é o ideal pra não remoer nada aqui dentro, mesmo que doa na gente. Porque dói, não vou mentir pra você. Mas a gente começa a sentir antes, no momento em que nós percebemos que queremos deixar vocês. Nós, os que abandonam, sofremos desde o momento em que negamos isso. Negamos, adiamos, tacamos fogo e sofremos silenciosamente até o dia em que não machuca tanto assim porque já machucou. Daí a gente vai lá e corta o laço. Dói mais um pouco, mas não tanto. E é nessa hora que começa a doer em você.

    Eu escolhi a forma que achei ser melhor pra mim. Sempre escolho. E te devo desculpas por isso. Porque não precisa ser mais difícil do que geralmente é. Eu podia ter escolhido melhor as palavras e ter te confortado. Podia ter dito que tava confuso, sim, e que precisava de um pouco de espaço. Que talvez amanhã as coisas melhorassem, mas não. Eu fui direto ao ponto e te enfiei uma faca na garganta, quase te impedindo de chorar. Disse umas coisas horríveis e ainda acendi o cigarro, maldito cigarro. Quem é que acende o cigarro na hora que diz pra alguém que ama (ou amou) que vai embora?

    Então te digo eu que eu errei e muita gente erra. Não é um pedido de “volta pra mim”. Tá mais pra um “desculpa pela forma como disse aquelas coisas horríveis”. Nunca foi sobre você, foi sobre como a gente não pode deixar que o fim abale a história que a gente teve porque, pensando bem, foi bonita pra caramba. E eu te devo alguns agradecimentos pela parceria e pelo afeto, por ter feito a minha vida doce por um tempo, mesmo que eu tenha escolhido ir embora pra outro lugar. Aprendi muito com você e no meio disso me lembrei que a gente não precisa tratar como desconhecido quem já foi amor, não precisa magoar mais ainda alguém que vai sofrer pela nossa falta.

    Existe sempre um momento em que a gente escolhe entre partir o coração de alguém ou deixar uma lembrança boa, e isso depende da forma como a gente decreta o fim. Eu escolhi o pior caminho e sei que muita gente também fez, talvez involuntariamente, talvez porque exista gente má nesse mundo mesmo. Mas existe sempre um momento em que a gente escolhe se conserva o amor num baú ou transforma tudo em cinzas. Eu cremei o que era nosso e hoje entendo que não precisava ter sido assim. Me desculpa por isso também.

    ass-dani


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