• Sua felicidade é real se não for  postada no Facebook?
  • Sua felicidade é real se não for


    postada no Facebook?


    O despertador, que mais parece um dj recém saído da balada, toca a sua música preferida no criado mudo avisando que um novo dia está prestes a começar. Antes mesmo de abrir os olhos as mãos já tateiam ansiosas o celular que vibra ao lado, notificando as novidades do Facebook, Instagram, WhatsApp, Pinterest, Twitter e até a previsão do tempo mundial. A esta altura a meta de chegar cedo ao trabalho, pegar um trânsito menos caótico, ou tomar um café da manhã calmo e decente já foi por wi-fi abaixo. Poderia estar dormindo, investindo em um começo de dia mais tranquilo, poderia até fazer 15 minutos de ioga matinal para aliviar o estresse, porém não, estamos todos conectados no resto do mundo antes mesmo de sair da cama. Aliás, acho que nunca nos desligamos. A questão é, o que os outros têm a dizer sobre você ou sobre a vida “perfeitamente moldada” deles, faz realmente alguma diferença para você?

    A tecnologia é uma ferramenta social tão presente e indispensável que agora já pode ser considerada um vício. Ninguém consegue mais viver sem contar para os 500 amigos do Facebook (a grande maioria nunca deu nem um “oi” descompromissado) sobre o quanto se é feliz, tem um relacionamento maravilhoso, está ficando sarado na academia ou que curtiu a noite de sábado na balada pagando a vodca mais cara do lugar para todos os “amigos do peito”.

    É preciso curtir a foto do cachorro fofinho para mostrar que você tem um coração sensível, compartilhar a corrente do bem em prol da creche da sua amiga para se mostrar engajado, e responder prontamente aos convites do aplicativo de mensagens para garantir seu final de semana na companhia de alguém (não importa quem). Participar de projeto social, doar sangue, resgatar aquele gato sujinho perdido na rua longe das vistas dos outros, ninguém quer.

    Mais do que viciadas no universo cibernético em si, as pessoas estão viciadas na vida de outras pessoas. Em saber o que a Sandrinha tem feito da vida, se o Ricardinho separou da namorada, ou se aquela menina nada simpática do trabalho finalmente se casou. Aí me pergunto, o que qualquer uma das respostas para as perguntas acima modifica na minha vida? NADA. A infelicidade ou o prazer do outro continuam não pagando as minhas contas, muito menos resolvendo os meus problemas. A coisa ficou tão absurda que não se consegue mais respirar em paz, sem parecer virtualmente perfeito e intocável perante os olhares curiosos dos outros.

    Não é drama, muito menos exagero. Basta olhar para os seus amigos conectadíssimos na mesa de bar, seus parceiros na cama (sim, tem gente que não desliga o celular nem entre quatro paredes), ou para a cena peculiar da adolescente que faz caras e bocas com seu batom vermelho, procurando seu melhor ângulo fotogênico no banheiro da festa. Você podia estar amando, sorrindo, se divertindo, relaxando (o que é bem difícil nos dias de hoje), tendo orgasmos, literalmente vivendo, mas prefere organizar o arranjo floral da mesa do restaurante ao lado do prato de nome diferente, com a garrafa de vinho caríssima ao fundo, só para mostrar/provar/exibir para sabe-se lá quem, que sim você é, pelo menos disfarçadamente, feliz. Pensa bem, ninguém é tão sublime e tem uma realidade tão maravilhosa quanto pintam por aí.

    A nossa travessia é feita de dias turbulentos, situações inesperadas, rompimentos bruscos, celulites, gordurinhas no culote e mais um bocado de coisas que nos tornam humanos e não meras máquinas. O vício tecnológico só serve como parâmetro comparativo da grama do vizinho, e no fim, quem sofre é você por sempre acreditar que poderia ser/ter mais e não tem.

    O mundo virtual facilita muita coisa na vida da gente, isto é um fato. É muito mais fácil organizar uma comemoração pela rede social, se atualizar das novidades dos amigos, até as empresas de recrutamento andam abusando das ferramentas online para escolher seus contratados. Mas isso só é conveniente porque todo mundo está viciado na interação pessoal por uma tela de computador ou celular. A partir do segundo que a gente se dá um tempo de descanso de todas essas mídias, milagrosamente as pessoas que realmente importam na nossa vida, que de fato se interessam pela nossa felicidade e bem estar, começam a se fazer presentes da forma que sempre deveria ter sido. Elas ligam, escuta-se a voz acolhedora ao invés de um texto digitado, elas aparecem na porta da nossa casa para oferecer “apenas” um breve abraço, elas sentam num happy hour para literalmente conversarem sobre o rumo da vida, e não para postar em qualquer lugar a ousadia de sair do trabalho para uma noite de diversão em plena terça-feira.

    Um universo inteirinho de possibilidades e oportunidades bate à nossa porta todos os dias e a escolha de viver ansioso, estressado, acoplado a um aparelho eletrônico como se fosse a extensão da nossa alma, é totalmente de cada um. Do lado de fora tem bolo, beijo esmagado, abraço apertado, pipoca com guaraná, sexo olhando no olho, samba até altas horas da madrugada, tem gente sorrindo ao nosso lado. Do lado de dentro de uma tela ninguém sabe o que tem de verdade. Pelo menos eu ainda não sei adivinhar emoções e sentimentos por trás de um emoticon sorridente. Numa dessas o tão esperado amor das nossas vidas tropeça bem na nossa frente e a gente nem vê. Mas o que importa é a curtida instantânea na foto do Marquinhos que nem nunca te notou. Acho que mais vale vários amores platônicos perdidos numa timeline, do que uma conexão real novinha em folha ao alcance da nossa sorte e do nosso merecimento.

    danielle


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