Se você vai apagar a luz, é melhor ir embora. Você diz que prefere descobrir o meu corpo enquanto eu descubro o seu, mas não é assim que eu sinto. Sinto como se você usasse a escuridão pra não me olhar nos olhos, não olhar os quadris mais largos, não enxergar minhas marcas de expressão. Sei que é pra disfarçar as coisas que você não quer ver.
Eu queria que você deixasse a luz acesa, porque me incomoda que você queira sempre se esconder de mim – e me esconder. Você me beija e não me olha, dá pra perceber as olhadelas pro lado, o rubor escondido, dá pra perceber que você não fica confortável. Imagina como eu me sinto?
Não sei, eu juro que não sei, não sei se você também tem medo do que eu vou achar, mas olha, eu não ligo. Não ligo mesmo se for insegurança sua e eu queria tanto que você não ligasse, porque a luz apagada só faz com que eu sinta que você deveria desaparecer também. A gente faz um trato: você me ama de luz acesa e eu prometo que te olho mais de perto, vejo as suas marcas e o que o tempo contou na sua pele, vejo as camadas e o cabelo grande de perto. Você faz o mesmo.
Eu quero alguém que me ame de luz acesa.
Você me ama de luz acesa e promete que vai fazer de tudo pra me enxergar. Enxergar o jeito como eu me sinto com você e todas as coisas, o olho revirado, o lábio semiaberto. Me ama de luz acesa na cama e fora dela, bem claro, olhando pra quem eu sou de verdade. Eu faço o mesmo, e vamos passar a saber como é lidar com a parte feia do outro também. As partes marcadas na pele, os gestos feios, as comoções desnecessárias. O cabelo desgrenhado e a barba rala, as entradas e o nariz adunco, aquele sinal de nascença que as pessoas te disseram que é feio e tudo mais. É aí que a gente percebe que talvez nem ache feio o que a nossa parte insegura diz que é. É aí que a gente descobre se ama mesmo ou se precisa apagar a luz.