Já não ouço aquelas propostas de programas estranhos numa quinta-feira pela manhã. A exposição maluca que vai abrir num museu do Centro não me pertence mais. Já não preciso me preocupar com as músicas invasoras no apartamento e que me faziam sorrir de preocupação com a sanidade do ouvinte. Aprecio o silêncio da minha própria cabeça histérica.
O único diálogo a que me permito é com as paredes. Elas me dizem coisas sobre quem estava por aqui que eu mal acredito. Desdenho achando que é mentira. Elas fazem suposições. E, quando preciso, guardam todos os meus segredos. Elas sabem exatamente como estou. E como estou? Tenho o tempo inteiro e de sobra para mim. Não posso me furtar de celebrar isso. Não quero reclamar. Este é um ponto feliz na curva.
Confesso que sinto falta do show que, certas vezes, se desenrolava por aqui. Falta o drama daquela unha quebrada, do olhar para o espelho e a reprovação do que se via. “Estou gorda”, palavras preferidas. Falta a comédia do encontro dos dentes enquanto tentativa de beijo. Ou, ainda, o excesso de espuma durante um banho duplo. Seria hipócrita se não dissesse que sinto saudade disso.
Ainda assim, pelo menos sou todo meu agora.
A praia é toda minha. Esqueça a areia da canga atirada pelo vento. O fim de semana é meu, a observação das nuvens de formas variadas e divertidas é minha. Eu sorriso sozinho pro Céu. Poderia me queixar, mas não o faço. Não seria genuinamente certo. Pedi tanto para ficar assim que não me julgo capaz de abraçar o arrependimento. Isso é coisa dos fracos que não aceitam as suas consequências. Eu pensei muito nos atos.
Sabe, as ondas não se arrependem de arrebentar na costa. As lágrimas também não podem querer voltar aos olhos depois de se encontrar com o chão. Ou com a boca. Os passos dados não podem querer voltar aos pés. Agora o Tempo é todo meu, por mais que eu sinta Saudade. Sim, Saudade. Por mais que você imensamente me falte, sem você agora eu sou todo meu.
