Ceder é diferente de ser submisso, que fique bem claro. No primeiro você busca um equilíbrio de vontades, renuncia momentaneamente a um dos lados, e porque não, evita a fadiga de uma discussão desnecessária. No segundo você se menospreza. Se inferioriza, se escraviza, se esquece. Saber discernir entre os dois conceitos é essencial para que a relação não caia nas mãos de uma prisão bastante sutil, porém perigosa: a chantagem emocional. Uma vez que o jogo tenha se iniciado é quase impossível vencer a partida sem avariar o sentimento soberano que move a parceria: o amor.

Não conheço nenhum ventríloquo, mas sempre que via alguma apresentação pela TV me sentia um pouco incomodada. Os bonecos sempre ostentam um sorriso feliz e alegre, como se a melhor coisa do mundo fosse ser manipulado por alguém, enquanto os telespectadores esperam ansiosos pela próxima interação unilateral entre o brinquedo e o seu criador. Quando a gente transpõe esta ilusão para a vida real uma única pessoa impõe as regras da convivência e outro apenas responde da forma como é o esperado. A felicidade é falsa, a “opressão” é muito bem mascarada perante a sociedade e o amor se resume em vários: “Mas então você não gosta de mim”.

O grande problema é que identificar que se está sendo alvo de uma chantagem é muito difícil. A gente acha que é carência, insegurança, uma ocasião em particular, tenta amenizar, agradar, resolver, e na maioria das vezes abaixa a cabeça e deixa passar. Acontece que o acúmulo de submissões cria um hábito nada saudável. É muito fácil se acostumar com alguém vivendo exatamente sob as nossas regras, realizando os nossos desejos e incentivando os nossos caprichos. Mas relacionamento não foi feito para isso. Ou o ajuste satisfaz ambos os lados, ou uma hora o samba desanda e aí é muito complicado encontrar o ritmo certo de novo.

O bacana de se envolver com alguém é a possibilidade de aprender algo sobre a vida com uma pessoa que foi criada, muitas vezes, com uma visão de mundo diferente da nossa. É justamente isso que agrega valor à parceria. Não temos mais cinco anos para tentar moldar o outro à nossa semelhança, como se fosse uma massinha de modelar. Temos as nossas vontades, a outra metade também. Isso não significa aceitar de bom grado tudo que é imposto, pelo contrário, quer dizer que é preciso sabedoria e parcimônia para ponderar quando é necessário calar e quando é urgente rugir.

Se a nossa voz sempre silencia frente a uma colocação, a uma cara de “cachorro sem dono” acompanhada de um questionamento sobre o nosso sentimento, ou diante de uma troca de favores em que a gente só se beneficia de alguma maneira se fizer a vontade do outro, infelizmente, estamos assinando um atestado de marionetes. Acho que todo mundo aqui já passou da idade de brincar de casinha e quer um relacionamento de verdade. Nesse caso, solta estas amarras, bota a boca no trombone e se liberta.

Conhecer um meio termo faz parte do amadurecimento. Aprender a dizer (e a ouvir) um não também. Não gostou? Conta tudo para a sua mãe! Ou abandona o instinto de dominação e vai viver uma parceria de verdade. Com sorrisos, lágrimas, descompassos e muito amor. É bem mais legal do que inventar falas para um personagem que não é seu.

danielle


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