Sentei na mesa da padaria da esquina e pedi um suco de laranja. O calor me deixava cansada e o corpo não respondia bem ao verão. Abri o livro que tinha nas mãos, ajeitei os fones de ouvido e me preparei para refrescar um pouco no ar condicionado, antes de voltar ao trabalho. Em vão.
A leitura não fez efeito para me distrair, tomei alguns goles de suco e resignada pensei nele. O álbum na playlist era um country-blues, eu acho, John Mayer, para ser mais precisa. Não sou perita em ritmos, mas adoro letras, sou apaixonada por palavras e elas me alcançam fácil. A música falava de um caso, de alguém que precisava tomar coragem e incentivava, “diga o que você precisa dizer”. Como não lembrar dele e das perguntas sem resposta com as quais me deixou.
Nem sei direito o que exatamente aconteceu entre nós. Sei que eu só havia tido um grande amor, até então, antes de sentir meu coração saltar para aqueles novos braços. Apenas um, desses de entrega mesmo, que te fazem investir em algo, acreditar que vai dar certo. Não deu e doeu. Antes haviam sido apenas paixonites bobas de adolescente, nada que colocasse minha sanidade a prova, ou que me fizesse sofrer com o término, tudo muito raso, sempre.
Fora um relacionamento longo e decepcionante, quando terminou pensei que demoraria um bom tempo antes de gostar de verdade de alguém. Afinal eu sempre fui dura na queda, nunca apaixonei fácil. Mas então, enquanto eu andava por aí desprevenida, ele apareceu. A razão me mandou correr na direção contrária, sem parar, até fazer inveja ao Tom Hanks em Forrest Gump, mas, me dei ao luxo de não ouvir o cérebro que acenava desesperadamente indicando “problema à vista”.
Lembro com uma gama gigantesca de detalhes da noite em que falei para este recém chegado como eu realmente me sentia. Ele estava por cima de mim, apoiado nos ombros, um braço por baixo da minha cintura, os lábios úmidos do beijo recente. Tinha me pedido para falar o que estava pensando, já que havíamos acabado de ter uma conversa dessas que presume colocar as coisas nos trilhos, mas eu falara bem pouco. Por fim, decidida, segurei o rosto dele entre as mãos, os cabelos escorregando pelos dedos, os olhos cravados nos meus, sorri e entreguei o jogo. Estava apaixonada, falei com todas as letras.
Se nos meus olhos havia determinação e calor, nos dele uma sombra de desespero surgiu e eu pude ver exatamente quando as pupilas me gritaram “a porra ficou séria”. Claro que ele não respondeu, já tinha me dito estar apaixonado em outra oportunidade, mas parece que algo esfriara e se antes eu era alguém a conquistar, agora estava conquistada. Porém solitária nessa nova dança. O que era para ser um encontro com a dupla perfeita, acabara de tornar-se um ato solo. Eu era o cisne definhando no palco.
Nunca foi do meu feitio entrar às cegas numa paixão, mas com ele saltei de um impulso só, sem paraquedas. Claro que acabei dando com a cara no asfalto e estilhaçando o coração, porque é assim que a história fica boa, ou não. Fiquei ali, estatelada no chão frio da vida, catando meus membros espalhados pelo cimento. Não entendi nada. Mas não era para entender. O fato é que o amor não é uma ciência exata, aliás, nem ciência é.
Você pode fechar os olhos, respirar fundo e declarar seus sentimentos na beirada da cama para alguém que parece estar nessa com você. Talvez ele te abrace e seja recíproco, talvez você tenha que lidar com uma resposta muda enquanto sua respiração desacelera. Nesse momento você vai sentir o oxigênio esvair dos pulmões, o sangue congelar nas veias e vai desejar estar mortinho… Mas, acredite, vai sobreviver a esse vácuo e a essa falta de eco ao seu amor.
As palavras vão ricochetear nas paredes e morrer ali, vai ser triste de ver. A dúvida vai te seguir por algumas dúzias de dias. Mas ok. Acredite tem coisa pior, digo isso por experiência, infelizmente, própria.
O curioso da vida é que se em determinado momento fui vítima das armações românticas dela, em outro acabei me tornando carrasco, mesmo sem querer. Alguns dias depois de abrir o coração e ver a indiferença me atingir feito um soco no estômago, foi minha vez de calar ante à paixão de alguém. Não me senti bem com isso, adoraria sentir o mesmo, sair daquela situação de mãos dadas e com um sorriso no rosto. Mas não pude mentir… Não sentia o mesmo.
Não sei se é sorte ou destino, mas amar alguém e ser correspondido no mesmo tempo e espaço, às vezes me soa como milagre. Desses que acontece com os outros, não comigo. Espero, honestamente estar errada. No dia seguinte aquela malfadada noite, em que desempenhei com maestria meu possível “papel de trouxa”, como é conhecido popularmente, me senti péssima, me arrependi e quis fazer as malas para algum país onde homens não existissem. Pensei em morar com alguma tribo de mulheres nômades que viviam a vida isoladas de sentimentos românticos tolos e ingênuos, mas não encontrei nenhuma.
Passadas algumas semanas comecei a me sentir melhor, não estava errada em me deixar enxergar. Sim eu abri a armadura e me permiti fragilizar, fiquei exposta e este foi um dos atos adultos que me exigiu maior coragem. Eu disse o que precisava dizer, extravasei antes de sufocar… Me senti terrível depois, pensei maneiras de “desdizer”, de voltar atrás e somente beijá-lo, ao invés de despejar um monte de sentimentos nos ombros dele.
Mas, hoje vejo que não errei. Sem o coração aberto jamais saberia até onde poderíamos ir. Até onde ele estava disposto a ir e talvez acarretasse danos maiores com o passar do tempo. Fiz as pazes com John Mayer, ele deu um bom conselho por fim: “say what you need to say…”