• Quando a gente aceita os joguinhos
  • Quando a gente aceita os joguinhos


    Há uns anos, lá na minha ilustre adolescência, fazer joguinhos era uma maneira de manter a coisa interessante. Não sei quem culpo: os tempos áureos, a falta de maturidade, o signo de libra ou qualquer outra coisa que sirva para tirar a culpa de cima de mim. Mas o fato é que o tempo passou e me tornei completamente avesso a jogos.

    Aderi à estratégia da sociabilidade sincera: nada de amizades com segundas intenções, jogava logo para o outro que as minhas intenções envolviam muito mais contato físico do que o contido entre amigos. Se dava certo? Não sei. Não sei se era a melhor forma, mas era a forma mais correta de colocar as coisas no papel e evitar perda de tempo, erros de interpretação, cinismos descarados e gente saindo machucada de todos os relacionamentos. Finalmente, eu que sempre fui desses enrolados, tinha largado mão de ser jogador.

    Só que isso não me fazia deixar de cair em joguinhos. Porque não importa o tanto que você deixe de fazê-los, você ainda pode cair na armadilha de um deles.

    Existem cenas clássicas de jogos: o quer-mas-não-me-quer, aquele que namora mas te ama, aquele que responde quando é conveniente, aquele que é a mais pura fofura e depois some por trinta dias etc e tal. Em resumo, gente que não sabe o que quer da vida e acaba por te envolver em um fluxo de comunicação muito complicado que geralmente acaba em nada além de estresse e da criação de um bode gigantesco por aquela pessoa.

    Então por que nós continuamos caindo numa dessas se é tão fácil reconhecer o jogo? Porque a gente aceita. Aceita porque gosta da pessoa. Aceita porque gosta de emoção. Aceita porque acha divertido. Aceita porque quer alimentar nosso próprio ego. Aceita porque não quer ser rejeitado. Aceita por uma série de razões que variam muito, mas que acabam entregando as pontas: nós somos todos frouxos, principalmente quando estamos emocionalmente envolvidos com alguém, e acabamos aceitando o que vier só para não perdermos a pessoa.

    Quando a gente aceita joguinhos, nós não podemos cobrar nada do outro. Não adianta ficar fulo da vida porque não obteve resposta se no dia seguinte você continua conversando como se nada tivesse acontecido. Não adianta exigir esforços do outro se você admite que ele cague e ande para você no dia a dia como se nada tivesse acontecendo. Não adianta reclamar de uma infinidade de coisas se você se presta ao papel de aceitar isso, até porque só existe relacionamento com uma ou mais pessoas envolvidas.

    Se você não está feliz ou satisfeito, você pode sempre jogar a real, dar um ultimato, resolver as coisas como bons adultos resolveriam na base do diálogo e da sinceridade de intenções. A outra pessoa pode escolher entre corresponder o que você espera ou não. O mesmo vale pra você. No fim das contas, é como um grande contrato de adesão de serviço. Você pode ler as regras explícitas e implícitas, declarar que leu e concordar com aquilo sem reclamar de nada. Ou você pode pegar tudo isso e jogar no lixo até achar algo que seja realmente satisfatório para você.

    daniel


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