No mundo ideal das relações, você espera pouco ou nada, oferece apenas o que pode e recebe apenas o que merece.
No mundo real – bem-vindo à modernidade líquida dos superegos inflados inseguros! -, entretanto, você espera muito ou tudo, oferece apenas oque lhe é exigido pelo contrato tácito dos relacionamentos sérios e recebe apenas o que todo mundo diz que as pessoas devem receber em uma relação, porque, oras, todo mundo diz que é assim, e é assim desde sempre.
Quando você usa um rótulo, abre todas as portas para as expectativas.
É um namoro, toquem as trombetas: todos – ou quase todos – os finais de semana juntos fazem parte do pacote (mesmo que você não queira ou não possa, porque um namoro é um namoro).
Elogios ao cabelo novo também fazem parte do pacote – sem nenhuma espontaneidade, apenas porque namorados elogiam os cabelos das namoradas e vice-versa, e se você esquecer, vai ter greve de sexo.
Você tem que conhecer a família dele. E os amigos dele. Tem que sorrir pra eles mesmo se forem chatos porque é isso que namoradas fazem. Porque sim. Porque um namoro é um namoro, oras.
Você precisa dar explicações. Muitas explicações. Namoros não sobrevivem sem explicações. Então trate de ter explicações sobre o passado, opresente e o futuro. Namorados e namoradas são naturalmente curiosos.
É um casamento: atenção quando ela pintar as unhas. Aprende a consertar chuveiro elétrico, que é obrigação de marido. Pare de se comportar como uma adolescente, mesmo que só de vez em quando, porque mulheres casadas não se comportam como adolescentes. Aguente os parentes cobrando filhos e responda sempre com ternura. Dê mais algumas explicações – não só ao marido, mas também à família dele.
No fim das contas, se sobrar tempo depois de todas as explicações, cumpridas todas as exigências, você ama: amar é a parte boa das relações.
E a única parte boa disso tudo é que dá pra amar sem namoro. Sem casamento. Sem amizade colorida. Sem dar nenhum outro nome ao amor, porque amor já é um nome bom o suficiente.
Os rótulos, penso, sem certeza, servem para nos dar a ilusão de uma garantia que nada e nem ninguém pode nos oferecer: a garantia de que o outro nos pertence. Pertence coisa nenhuma. Não existe rótulo de amarração – isso é delírio da modernidade líquida.
O que garante a monogamia, a honestidade, as explicações e os domingos bonitos – com rótulos ou sem rótulos – é o amor, enquanto houver amor.
Os rótulos, ao contrário, cagam as regras que matam a espontaneidade até que não sobre mais nada do amor além de regras cagadas, aquelas regras que garantem uma pseudosegurança da qual a gente infelizmente ainda precisa.
E a gente só precisa porque não escutou Caetano: “Toda razão, toda palavra, vale nada quando chega o amor.”