• Todo Mundo Tem o Direito de Se Arrepender
  • Todo Mundo Tem o Direito de Se Arrepender


    Jamais esquecerei a sábia resposta desferida pelo meu pai ao ser questionado e chamado de louco por ter deixado o filho de quinze anos fazer a primeira tatuagem. Sem pestanejar meu herói disse: “Eu deixei, pois todos têm o direito de se arrepender” e aquilo soou como um tapa estalado na cara besuntada de bronzeador daquela mulher que perguntou aquilo, pois provavelmente criava os filhos em aquários e nunca teria coragem de deixá-los arriscar nem mesmo dez passos para fora da sala de estar.

    Isso aconteceu há aproximadamente onze anos e hoje, apesar de eu ter ironicamente me arrependido por ter perpetuado aquela águia nas costas que hoje mais parece uma pomba anoréxica, recuso-me a contentar-me com a sensação de dúvida diante daquilo que eu poderia ter feito e por medo deixei de fazer. Eu não aceito mais engolir meus desejos e viver sob a falsa blindagem das utopias, insuportáveis para quem não vê paudurescência nenhuma em começar uma frase com: “Se eu tivesse dito a ela…” ou “Talvez tivesse dado certo se eu…”.

    O mundo está inundado de sonhadores, pessoas que vão até o Karaokê e embriagados cantam Imagine como se assim pudessem telepaticamente dar nós em todos os fuzis da guerra. Seres que se alimentam de fictícios amores platônicos e verborragicamente cospem advérbios de dúvida em cada parágrafo da vida. Pessoas que no fim da existência, já em cadeiras de balanço imóveis e enferrujadas, relembram o passado através do que nunca passou: por meio dos insípidos beijos nunca beijados, do inodoro cheiro dos paraísos nunca visitados e pior, do peso indigerível das tantas palavras engolidas – verdades que facilmente caberiam em pequenos dizeres e teriam sido capazes de ensolarar multidões, mas nunca foram ditas.

    Por isso, não subestime o correr do tempo e tenha plena certeza que os ponteiros nunca vão parar para esperar sua indecisão sobre dar o primeiro passo rumo à realização. Deixe para sonhar com coisas realmente impossíveis de serem concretizadas fora do fantástico mundo do sono. Prefira sempre o risco eminente de um tapa na cara do que a insuportável certeza de a mulher que deseja nunca invadirá sua casa faminta pelos seus lábios medrosos.

    Ouse mil vezes mais e quando uma mulher linda atravessar a faixa de pedestres bem em frente ao seu carro, não se contente apenas com a emissão de olhares pseudo sedutores e com a criação de fantasias mentais, nas quais você e ela caminham numa noite de primavera em uma rua que cheira damas da noite – use a criatividade para outros fins. Seja homem, saia do carro agora, enfrente as buzinas e drible os fiscais de trânsito, diga a ela que quer conhecê-la e corra o risco bom dela aceitar sua proposta e torná-la mais indecente do que jamais sonhou.

    E se der errado? O máximo que pode acontecer é você tomar uma joelhada nos testículos, ter seu veículo guinchado, ser vaiado por todos os motoristas do farol após seu falho ato Don Juanista e ainda ter essa cena lastimável vista no YouTube por milhões de pessoas, mas e daí? Vai dizer que prefere voltar pra casa, dar play num filme pornô e gozar com o pau alheio? Eu não.


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