Eu estava no último ano da faculdade de Jornalismo em São Paulo, na maratona que é redigir um TCC. Meu orientador lia um texto que eu acabara de entregar, comigo na sua frente. Eu, toda ansiosa, observava cada micro-expressão dele. No final da página, ele me olhou por 3 segundos e disse: “Vanessa, você escreve muito bem sem esforço.” Como ele é um dos melhores editores que tive na vida, abri um sorriso enorme na hora e agradeci o elogio. Ao que ele prontamente respondeu: “Você não entendeu. Eu disse que você não se esforça.”
Tem uma coisa muito errada com você. E tem uma coisa muito errada comigo também. Com esta nossa geração, esta que dizem ser Y, ou X, ou Z, ou eu já perdi a conta. Mas esta que está entre os 20 e os 30 anos, esta que está dominando o mundo, esta dos jovens adultos. A gente quer tudo de mão beijada.
Seja no amor, no trabalho, na fila da padaria. A gente foi criado com tantos “Ai, como você é lindo”, “Princesinha do papai”, “Meu filho é muito inteligente”, que a gente fez a pior coisa que pode ser feita com palavra de pai e mãe – a gente acreditou nela. A gente acreditou que é especial, que merece muita coisa do mundo, que a vida não faz mais do que sua obrigação ao nos recompensar pela dádiva de existir por aqui.
A gente acha que as coisas vão dar certo. E isso nem sempre é uma coisa muito boa, porque a gente não raciocina que as coisas vão dar certo porque nós trabalhamos muito pra isso, porque nos esforçamos, porque demos nosso suor pra chegar lá. A gente simplesmente sabe que tudo vai se desenrolar, vem uma certeza divina de algum lugar da nossa alma (quem sabe, nossa auto-estima inflada e descolada da realidade) de que as coisas vão se ajeitar, porque nós somos fodas demais pra que elas não se ajeitem.
Como resultado disso está aí, o mundo. Esse lugar maluco que está virando ainda mais insano. Jovens de 20 e poucos anos que entram num emprego e saem dois meses depois porque “não estava a sua altura”. Profissionais que mal saíram das fraldas e ficam decepcionadíssimos quando seus chefes não descobrem, em algumas semanas, que estão diante de um novo gênio da humanidade. Namorados e namoradas que pulam fora da relação em minutos, assim que percebem que não estão sendo apreciados como a melhor criatura que já andou sobre a Terra.
Nos relacionamentos, então, a situação fica bem complicada. Porque nada é dado de bandeja. A vida não chega como em um conto de fadas e traz o príncipe encantado (que nem existe) ou te coloca bem em frente da sandália de vidro da sua Cinderela. O amor é construído, o amor precisa de bases, precisa de carinho, de cuidados, e principalmente de humildade. Precisa de duas pessoas que se coloquem de igual para igual e resolvam que, no meio de toda esta loucura em que vivemos, elas vão se apoiar mutuamente. Não competir entre si, não querer que tudo caia no seu colo, não achar que simplesmente tem direito a tudo que o outro faz por você. Mas ralar em conjunto, trabalhar no que vocês têm juntos, dia a dia.
Eu também fui criada na base do “como você é inteligente”, eu também não aprendi o valor de tudo que tem realmente valor, eu também entrei na vida adulta frustrada por encontrar um mundo tão diferente daquilo que eu tinha em mente, e que não abria todas as portas pra um despreparado qualquer só porque ele tinha a plena certeza de ser brilhante. Mas, ainda bem, as recompensas vieram. Um montão delas. Porque, entre as muitas coisas que eu poderia ter ouvido, alguém me disse uma frase em uma sala de aula. Que me fez, dali em diante, dar o melhor de mim o tempo todo. E me fez, cinco anos depois, trabalhar muito pra alcançar tudo o que eu queria. Uma frase que nunca me saiu da cabeça. E espero que não saia da sua também: você não entendeu nada. A culpa de você não ter chegado lá não é do mundo que não te reconhece. O mérito em fazer qualquer coisa bem não está no resultado, mas em quanto de você pode ser reconhecido ali. Está, antes de mais nada, no seu esforço.