• Se apegar é preciso
  • Se apegar é preciso


    “Desapegue-se” virou o conselho da moda, o pretinho básico dos textos de autoajuda.

    Se nas estações passadas o “dê tempo ao tempo” e o “quem espera sempre alcança” eram os pitacos mais utilizados na passarela da vida, hoje, querida leitora, basta derramar uma lágrima diante de uma amiga para perceber que o “desapegue-se” se tornou a maior das tendências, mais popular até do que os tons de cinza e do que o vestido-camaleão que vai do “azul e preto” ao “branco e dourado” em milésimos.

    Somos uma geração que encontrou na aplicação imoderada do “desapegue-se” uma forma de driblar as dores da perda e de facilitar os inevitáveis “tchaus” que a vida nos obriga a dar. Como assim? Simples: não nos apegamos profundamente nem aos nossos parceiros (as) amorosos, pois assim evitamos lágrimas se a relação – por acaso ou qualquer outro motivo – não der certo. Uma pena. Porque agir assim é tão absurdo quanto optar por nunca tomar bons vinhos em taças de cristal – e bebê-los somente em copos plásticos, descartáveis – por medo de sofrer se um dia, porventura, quem sabe, quebrá-las.

    Não se apegar de verdade à coisa alguma é uma saída (talvez a mais covarde de todas) que descobrimos para nos sentirmos imunes aos sentimentos ruins decorrentes de eventos inerentes à condição humana, como a morte, os términos de relacionamentos, as mudanças de cidade e outros que, de nós, certamente exigem desapego, mas que SÓ exigem desapego quando acontecem – e não enquanto são meras possibilidades, hipóteses.

    O que eu sugiro? Sugiro que você, em algumas situações da vida (principalmente nas suas relações amorosas), pratique o apego, mesmo sabendo que existe a possibilidade de um fim. Por quê? Porque começar praticar o apego é uma forma de não se esquecer de que algumas coisas ocupam lugares mais nobres do seu coração do que outras, e que, por isso, não há razão para trocá-las pelo tentador duvidoso ou por qualquer novidade oferecida como se fosse imbatível.

    Praticar o apego é, em outras palavras, mergulhar até o mais fundo ponto daquilo que lhe parece importante de verdade, mesmo sabendo que esse mar um dia poderá secar e, consequentemente, deixar-lhe sem rumo em meio à seca que parecerá – só parecerá! – insuportável. Entende?

    Praticar o apego é se mostrar diariamente disposto a se esforçar – ao máximo – para não ceder à tentação de trocar coisas importantes – como um relacionamento longo construído à base de muito zelo e dedicação – por qualquer ser que lhe dê frio na espinha e vontade de transar. E sabe por quê? Porque a pratica do apego nos ensina que se quisermos manter conosco o que realmente possui valor, inevitavelmente, precisaremos abrir mão de algumas oportunidades, bundas e vontades que, por alguns segundos, vão lhe parecer inadiáveis, mas que, se pensar bem, podem ser – e devem ser – descartadas em prol daquilo que não deseja perder.

    Praticar o apego é, grosso modo, desapegar-se dessa moda boba que nos faz acreditar que tudo é descartável a ponto de não merecer nossa dedicação máxima. É parar de achar razoável trocar de namorado – ao primeiro sinal de dificuldade ou defeito – como trocamos de carro, de roupa, de celular, de computador.

    Precisamos aprender a separar o que de fato é descartável daquilo que – graças ao inestimável valor que tem – deve nos motivar a descartar tentações duvidosas, de superficial, ilusório e fugaz prazer.

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