Não choro porque um dia o meu pai me disse que eu não podia chorar. Que era feio demais, então cobri meu rosto. Ouvi da minha mãe que eu deveria engolir o choro, e se tem algo que dói é engolir choro, principalmente quando você é uma criança que não entende nada daquilo.
Não choro porque nasci num lugar que diz que eu não posso chorar simples e unicamente porque sou homem. Dizem que choro é sinal de fraqueza e que homem nenhum é fraco. Essa mesma gente não enxerga a falta de coerência nisso? Talvez não enxerguem porque aprenderam a obedecer seus pais, e seus pais aprenderam a obedecer seus avôs, e toda essa gente foi enganada.
Não choro quando perco alguém que eu amo, e fui muito repreendido em funerais e despedidas. Talvez não entendam ou me achem desgarrado demais, talvez me achem livre das coisas que eu sinto, mas não choro. Não choro porque passei a vida toda com medo de parecer fraco, mesmo que não tenha nada de fraqueza no choro. Choro é sinal de vulnerabilidade, é humano, é uma forma de demonstrar que você se importa. Mas eles não querem que você chore.
Não choro porque sou fraco. Se fosse forte, teria levantado a voz e esbravejado. Teria dito aos meus antepassados que fracos foram eles por terem abaixado a cabeça e engolido o choro. Teria dito ao meu pai que botar pra fora o que se sente é mais importante do que qualquer ideia estúpida de privação por conta do meu gênero. Mas não disse, não digo. Porque homem não chora.
Não choro porque querem me transformar num ciborgue, num homem-máquina. Feito homem de lata que saiu por aí procurando um coração no Mundo de Oz. Não choro porque controlo os nervos como se fossem bits de computador, milimetricamente calculados para mascarar a tristeza ou a raiva. É melhor implodir, me disse papai uma vez. Respeitei. E implodi pelo resto da vida, aprendendo que engolir o choro é a coisa que mais dói no mundo.