• O amor não é receita de bolo
  • O amor não é receita de bolo


    “Quais atitudes eu devo tomar para mantê-lo sempre interessado em mim?”, “Qual a receita ideal para evitar traições e falta de tesão?”, “Ele mora em um estado e eu em outro, qual é a chance de a nossa relação dar certo?”, “Ele quer ter filhos e eu só desejo cachorros, o que digo para convencê-lo a mudar de ideia?”, “Estou em dúvida entre o ex e o atual, como decidir?”, “Como saber se ele é o cara certo para mim?”, “Será que ele me ama mesmo?”, “Não sei se é paixão ou apenas carência, existe uma técnica para descobrir?” e “Como fazer uma surpresa inesquecível?” são perguntas que eu ouço com bastante frequência, quase que diariamente. Questões feitas por pessoas ansiosas por uma resposta objetiva – algo como “Faça isso, depois aquilo, e tudo ficará bem!” – que quase sempre acabam frustradas quando eu, após uma longa inspirada, tomo coragem e respondo: o amor não é feito de medidas exatas como uma receita de bolo.

    A princípio, pode parecer maldade da minha parte, eu sei. Mas penso que fazer a pessoa compreender que as relações amorosas não são feitas de fórmulas matemáticas – e aplicáveis de maneira idêntica em todos os casos – é o mais honesto. Afinal, impedir que a pessoa continue acreditando que um relacionamento de sucesso pode ser construído com dez passos milagrosos é uma forma de privá-la de futuras e dolorosas frustrações e, também, uma maneira de fazer com que ela pare de buscar a solução para incômodos particulares no relacionamento da vizinha e dentro de revistas que dão dicas universais, como se todos os corações fossem iguais e batessem forte pelos mesmos motivos. Mas não são, né? E isso faz com que cada relação tenha uma necessidade de fermento e limite de açúcar.

    Atitudes grudentas que me sufocam e me fazem pensar seriamente em terminar uma relação, por exemplo, para um cara extremamente carente e inseguro podem ser perfeitas, motivos para agradecimento diário e “Agora sim encontrei a tampa da minha panela!”. Para algumas pessoas, namorar alguém que vive em outra cidade é algo impossível, possibilidade totalmente fora de cogitação; para outras, porém, com ajuda do Skype e de cartões de crédito que dão duas milhas por dólar gasto dá até para fazer acontecer uma relação intercontinental. Tem gente que se satisfaz com uma transa quinzenal e tem, também, gente que acha o namoro uma merda quando rolam “só” três trepadas semanais. Xingamentos na hora H deixam muitas pessoas excitadas, é verdade, mas há também aquela parcela da população que, em vez de “cachorra”, curte ouvir apelidos fofos no momento do bem bom. Cada um é cada um, não é mesmo? Além disso, vivemos em constantes mutações, o que dificulta ainda mais a vida de gente que teima em simplificar as relações em A + B; pessoas que querem encontrar o tal do ponto G por acharem que, depois disso, poderão ir direto ao ponto sempre.

    Eu acho que a maior graça das relações humanas é fruto, justamente, das variáveis indomáveis, imprevisíveis e nada exatas que as formam e desformam. Pois imagine só o quão chato ficaria o mundo se descobrissem uma fórmula mágica capaz de manter os relacionamentos estáveis e perfeitos por anos e anos? Do que eu escreveria se algum engenheiro alemão descobrisse que qualquer relação, sem exceção, pode ser construída de maneira infalível? Sobre a fauna do Atacama? Sobre um fenômeno do mundo gourmet chamado naked cake? Sobre…  Não, não me parece tão interessante quanto fazer devaneios a respeito daquilo que, no mesmo dia, pode causar uma sensação deliciosa de embriaguez e vontade de atear fogo em fotografias.

    Se o amor fosse sempre preto no branco e fácil de ser compreendido, quais desculpas nos restariam para tirar nossos amigos preguiçosos de casa e levá-los ao bar numa terça-feira à noite? “Cara, eu preciso tomar umas urgente. Sabe o que é? Estou encucado com a pia aqui de casa que não para de pingar uma gosta amarela. Tipo cera de ouvido…”. Não, não colaria. Acabaria em: “Irmão, chama um encanador logo e para de maluquice”. Mas ainda bem que o amor não é ciência exata e que frases como “Tô pirado de amor. Se é que é amor, né? Já que também tô sofrendo!”, geralmente, bastam para que nossos parças aceitem dividir cervejas e porções de batata conosco. E ainda bem que, horas e muitas saideiras de mentirinha depois, dificilmente há qualquer consenso ou martelo batido. Pois pense no quão chato seria se o amigo-ouvinte da vez, antes mesmo de a primeira cerveja chegar à mesa, desse-nos uma solução milimétrica e indubitável; algo como: “Diga que você a ama, dê sete lambidas giratórias no mamilo esquerdo dela e, quando notar que a umidade vaginal atingiu mais de 82%, introduza meia falange do dedo anelar na pepeca dela com a mesma intensidade que aperta o botão do elevador. Pronto. Ela será sua para sempre!”. Não seria nada legal. Provavelmente, acabaria toda a graça da resenha etílica e nos obrigaria a reclamar dos políticos até que as nossas amadas namoradas, por ciúme e derivados dele, comecem a nos ligar com a desculpa de que, em plena madrugada, precisam de chocolate em pó, ovos, fermento e outros ingredientes para um bolo. “Eu só liguei para relembrá-lo de trazer chocolate do padre em vez de Nescau. E também para saber… para saber… Vai sair daí logo ou vai continuar me enrolando, porra?”. 

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