É difícil ficar só quando se tem alguém, a questão é que é preciso. Viver com o outro é bem diferente de viver o outro. Sugar sua essência, seus dias, seus raros e caros momentos a sós. Parece contraditório depois de uma corrida desenfreada contra a solidão, quando finalmente se tem um par de pés quentinhos para dividir calor naquela noite fria, ter simplesmente que se conter para não se lambuzar ao máximo. O problema é que amor, seja ele novo ou velhinho, morre lentamente aos menores sinais de asfixia. É preciso saber nadar nesta correnteza de limites tão tênues. Desafrouxar os nós para que os laços nunca deixem de ser enfeites.

Não adianta ligar um milhão de vezes ao dia, preencher toda a agenda do parceiro(a) com horários que só pertencem a você, minar a cerveja com os amigos, o clube da Luluzinha ou aquela tarde gostosa para se ler um bom livro. Individualidade é o que sustenta as arestas de um relacionamento duradouro. É aquilo que não nos deixa esquecer quem somos nós quando as luzes se apagam, a plateia aplaude a cena e os convidados deixam felizes o teatro. A peça é conjunta, mas o brilho, os méritos de ter tudo dado tão certo após meses de ensaio, é de cada um. Para que cada metade integrante de uma parceria faça a sua melhor performance completa e absoluta na estreia dos amores da vida real, antes de mais nada, elas precisam ser sós.

Tem gente que naturalmente sente dificuldade de curtir a sua própria companhia e digo que estas são as pessoas que mais precisam de espaço, para descobrirem que a vida não acaba só porque o outro quis remarcar o vinho de toda sexta simplesmente porque surgiu um compromisso com um amigo de longa data. Imprevistos acontecem, mudanças acontecem, e vontades principalmente. E afirmo além, carência, expectativa, pré-conceito, nada disso alimenta de forma saudável uma relação. Deixa ir e tenha a satisfação enorme de abrir a porta quando voltar.

Casais que não cultivam este tipo de neura e essa necessidade sufocante de fazer parte de cada segundo da vida do outro, tendem a confiar mais no amor que construíram, não ficam de mimimi por qualquer coisinha e o mais importante: eles não transferem para a pessoa que escolheram para dividir o caminho a obrigação de fazê-los integralmente felizes. Clichê e óbvio, pena que tão menosprezado, mas a alegria da vida começa na gente. Ninguém está aqui para corresponder às nossas exigências, preencher nosso “quadro de qualidades”, tampouco para trazer sentido aos nossos dias. Que a gente saiba espalhar sorrisos por onde passa independente de ter ou não alguém ao nosso lado.

Deixa a menina curtir a tarde de sábado com as amigas e o gato tomar aquele chope gelado jogando uma sinuca lá naquele rock. A parte boa é que ambos voltam serenos e satisfeitos para casa. A parte ótima é que ambos permanecem na rotina do outro justamente porque sabem que podem partir quando bem entenderem. Nada, repito nada, dá aquela injeção afrodisíaca de ânimo tão boa em um relacionamento quanto soltar as amarras O rio vai seguir seu curso, dar uma breve desviada lá na frente, e voltará ao seu rumo inicial. Sem pressão, sem força divina, sem ameaças (sem se “você fizer isso eu termino com você”), sem questionamentos se esta é ou não a melhor travessia a ser seguida. Quando a gente se relaciona com alguém que entende que antes de sermos dois somos um pacote bem único e complexo, não existem dúvidas de onde se encontrar abrigo. Lar é onde somos livres para vivermos cada pedacinho de momento do jeito que a gente bem entender e o melhor, onde tem alguém absolutamente lindo abrindo portas e janelas para a nossa identidade passar.

Um passarinho me ensinou a dizer: “Que bom que você chegou, sinta-se a vontade para ficar, mas agora que temos esse segundo infinito, que possamos eternamente dançar”. Dancemos. Aquela coreografia louca a la Beyoncé que só a gente sabe ou de mãos dadas com uma parceria tranquila.

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