O mundo acha que eu tenho que acordar às seis horas da manhã para fazer exercícios (e muito feliz, postando fotos no instagram), tenho que estar sempre alegre, bem disposta, perfeitamente maquiada, sem parecer que estou de maquiagem. Com o cabelo penteado por horas nos mínimos detalhes, para parecer casualmente bagunçado, mas de uma maneira muito cool. Se ele estiver apenas bagunçado não conta, você está fazendo isso errado.
Tenho que cozinhar quitutes incríveis com ingredientes que custam mais caro do que uma ida ao restaurante e esfregar na cara dos meus seguidores como eu consigo ser uma profissional maravilhosa e ao mesmo tempo exímia cozinheira.
Tenho que ter um trabalho que me dá status, independente de gostar desse trabalho ou não, senão as pessoas vão ter pena de mim. Tenho que tirar fotos adoráveis com meus filhos ao invés de simplesmente brincar com eles.
Tenho que pagar três mil reais por um cachorro de raça que está na moda, mesmo que isso signifique ajudar a manter os canis que cruzam animais da mesma família, dando origem a cachorrinhos com diversas doenças e mesmo com a enorme quantidade de cães abandonados em busca de um lar. Foto de vira lata não dá o mesmo número de curtidas que foto de pug (mesmo que meu pug sofra de epilepsia e morra aos três anos de idade. Existem muitos outros sendo fabricados por aí).
Preciso viajar para lugares exóticos (todo mundo já foi para Buenos Aires e Paris, seja original, por favor). Tenho que ter um marido/namorado/ficante/noivo de aluguel/qualquer coisa, porque nada é mais humilhante do que ser solteira (nem mesmo viver um relacionamento meia-boca com uma pessoa que não me faz feliz).
E tenho que fazer tudo isso de salto alto, com uma roupa maravilhosa e uma lingerie de renda por debaixo disso tudo. Assim, vamos ensinando desde cedo às nossas filhas que compor um look digno de capa de revista vale muitos mais pontos no facebook do que ler um livro de literatura e saber fazer seu próprio tutorial de beleza te deixa muito mais próxima de ter um namorado aos onze anos do que brincar de queimada.
Tenho que ser tudo isso para as pessoas nas redes sociais acharem que eu dei certo na vida. E se eu resolver ser dona de casa, ficar em casa com meus filhos, tendo apoio do meu marido, vão dizer que estou envergonhando minhas avós feministas, sem entenderem que minha avós lutavam para que as mulheres fossem livres. Livres para escolher.
E se eu decido não ter filhos, não para priorizar carreira ou porque não gosto de crianças, mas simplesmente porque não quero ter filhos, vão falar que sou egoísta, amarga e vou terminar a vida sozinha. Se eu disser que quero viajar o mundo, sem ter um trabalho fixo e sem me importar em ganhar muito dinheiro, porque o mais valioso para mim é conhecer realidades diferentes, dirão que sou uma pessoa sem perspectiva (estudou nas melhores escolhas para levar vida de vagabundo?).
Se escolho priorizar carreira, não tiro férias por opção, passo mais tempo do trabalho do que em casa, porque amo o que eu faço, qual a dúvida de que vão dizer que minha ambição é nociva, que sou viciada em trabalho e estou jogando minha vida fora?
Não importa como eu escolha viver minha vida, as alternativas vão sempre estar erradas para os outros.
Eu posso ser lésbica, desde que seja bonita e/ou cheia de estilo, e posso ser negra desde que tenha traços delicados (vulgo: traços de brancos), posso ser gorda desde que não gorda demais, e posso ser pobre desde que tenha uma história de superação ou seja muito espirituosa e faça graça da minha pobreza. Eu posso ser diferente, mesmo porque ser diferente está muito na moda hoje em dia, mas só se for uma diferença que não perturba as pessoas.
Vivemos em um mundo que valoriza muito uma tal de “tendência”. Tendência é quase uma chave para a felicidade. Ela vai te ensinar como se vestir, que batom usar, o que está na moda, o que não está, com o você deve decorar sua casa, qual corte de cabelo você deve ter, quais aplicativos você tem que ter (TEM QUE. É isso ou sofrer exclusão digital), quais roupas valorizam o seu tipo de corpo (e acredite, você vai ser julgada por isso), e o que você deve fazer para ser valorizada como mulher (não por respeito a si própria, mas pelo que a sociedade vai pensar de você).
E ainda existem por aí mulheres que acreditam que só princesas encontram seus príncipes e que se você não se comporta de acordo, você só vai encontrar sapos na sua vida, como se as pessoas só tivessem uma única faceta. Bom ou mau. E fim.
O mundo vai dizer que eu posso ser tudo o que eu quiser, que eu posso pensar diferente, desde que o meu diferente seja igual aos outros. Que estejamos todos presos em uma mesma bolha, com pequenas variações de pensamentos, mas que não incomodam ninguém.
Bom, sinto muito mundo, que se dane você. Eu escolhi ser como eu sou. E a única tendência que eu vou seguir é a de ser eu mesma. E o único status que eu quero alcançar é o da felicidade.