Ela nem faz ideia que, às vezes, de manhãzinha, eu acordo mais cedo só pra ficar assistindo ela dormir. Isso não é só porque eu a acho linda desse jeito (o que eu realmente acho por mais que ela se recuse a entender), mas sim porque eu quero estar presente quando ela acordar. Quero ser a primeira pessoa que ela vai ver no dia. Quero estar lá. Eu quero passar a segurança que tem alguém cuidando dela mesmo quando ela nem nota. Longe de dizer que ela precisa de alguém pra olhar por ela. Nada disso. Ela é mulher bem da independente. Daquelas que imobilizam leões selvagens no arm-lock sem nem sequer pestanejar, já viu uma assim?
Ela nem faz ideia que, eventualmente, quando ela pede um táxi e eu a levo até o carro, eu decoro a feição do motorista e o número do veículo. Isso pra que, como um tira americano que obviamente sou, eu possa ir atrás dele caso ela demore demais pra me avisar que chegou em casa.
Ela nem faz ideia que, quando tem filme novo passando na tv e ela não está comigo, eu troco de canal na hora pra poder assistir pela primeira vez ao lado dela.
Ela nem faz ideia que, toda vez quando a deixo em casa, seja de carro, ônibus, a pé, de trem, caiaque ou camelo, eu espero do lado de fora ela procurar as chaves, abrir o primeiro portão, aí abrir a porta de vidro pra, só depois, pegar meu camelinho e ir embora.
Ela nem faz ideia que, mesmo tendo a plena consciência de que tanto eu quanto ela não temos a menor vocação culinária, eu fico procurando receitas diferentes pra gente testar na cozinha aqui de casa. Afinal, assistir Master Chef já dá todo o embasamento técnico que um chefe de cozinha precisa ter, não é verdade?
Ela nem faz ideia que, desde que ela entrou na minha vida, volta e meia, ao me pegar no flagra vendo o horóscopo, eu, além de ler a seção de gêmeos, leio também a de câncer.
Ela não faz a menor ideia que “eu te amo” é só uma frase – e que proferi-la não preencheria tudo o que eu tenho pra dizer.
